Num contexto de transformações económicas e sociais, Moçambique e o Banco Mundial estão a redefinir a sua parceria, com o sector energético no centro da estratégia. A aposta está centrada na transição energética e na inclusão social.
A cooperação dura desde a década de 1980, mas hoje ganha novo impulso com o chamado “quadro de parceria”, assinado, em Julho, entre o Governo e o Banco Mundial, para cinco anos. Mais do que nunca, esta parceria é vista como catalisadora de estabilidade macroeconómica, oportunidades e reformas estruturais. Este alinhamento marca o início de uma nova etapa de confiança mútua e de ambições renovadas, durante a visita de Ajay Banga, presidente do Grupo Banco Mundial, ao País. A meta é clara: “Se olharmos para um quadro de 10 anos no pensamento deste Presidente (Daniel Chapo), o objectivo é fazer de Moçambique uma potência energética e torná-la no ‘back office’ (centro) energético da parte sul de África. Penso que se trata de uma verdadeira oportunidade e de algo em que devemos trabalhar em conjunto”, referiu.
Energia como eixo de desenvolvimento
O Governo moçambicano e o Banco Mundial convergem na ideia de que o futuro do País passa pela energia, não apenas como fonte de receitas, mas como plataforma para a transformação económica. O sector é visto como alicerce da industrialização, da integração regional e do acesso inclusivo à electricidade, colocando Moçambique na rota para se tornar num centro energético de dimensão continental. Com reservas de gás natural estimadas em mais de 180 triliões de pés cúbicos na bacia do Rovuma, capacidade hídrica ainda subaproveitada e um potencial solar entre os mais elevados da África Austral, o País posiciona-se como um dos territórios com possibilidade de oferecer soluções diversificadas e competitivas para a transição energética.
A ambição inclui investimentos robustos na expansão da rede eléctrica nacional e a modernização de infra-estruturas críticas. Se for devidamente infra-estruturado, o País pode vir a ser uma peça-chave na estratégia de integração da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), com capacidade para reforçar o fornecimento de energia à África do Sul, Zimbabué e Maláui, ao mesmo tempo que atrai parcerias internacionais para acelerar a descarbonização e criar novas cadeias de valor industrial. Esta visão coloca a transição energética no coração da agenda de desenvolvimento, com a instituição multilateral a assumir o papel de financiador estratégico e facilitador de parcerias público-privadas.
O quadro de parceria pretende reforçar o papel de Moçambique como laboratório de soluções africanas em transição energética e responder a pressupostos básicos do desenvolvimento
Em concreto, Ajay Banga garantiu a disponibilidade do Banco Mundial e das suas agências para apoiar projectos já em andamento:
- Reforço da produção em Cahora Bassa, com a construção da central norte (conclusão prevista para 2032);
- Novo parque solar de 400 MW;
- Nova barragem de Mphanda Nkuwa, no rio Zambeze, com capacidade de 1500 MW e investimento estimado em 4,5 mil milhões de euros (a concluir até 2031).
Cooperação alargada, uma nova estratégia
No quadro de parceria assinado entre as partes, em Maputo, cinco áreas ganham importância estratégica num pacote de investimentos avaliado em 3,5 mil milhões de dólares. Além da energia, os sectores de educação, saúde, protecção social e infra-estruturas também entram na equação. Segundo Ajay Banga, presidente do Grupo Banco Mundial, a lógica desta aliança ultrapassa o campo tradicional da ajuda externa. O Banco Mundial assume-se como facilitador de parcerias internacionais, ligando Moçambique a redes globais de conhecimento, tecnologia e investimento. O objectivo não é apenas injectar recursos, mas criar condições para que o País se posicione como centro energético e logístico da África Austral, potenciando a sua localização estratégica, as vastas reservas de gás e carvão e as condições para exploração de energias renováveis.
Ao inserir o País numa agenda de integração regional e diversificação económica, o quadro de parceria pretende reforçar o papel de Moçambique como laboratório de soluções africanas em transição energética, ao mesmo tempo que responde aos pressupostos básicos do desenvolvimento: transformar riqueza natural em bem-estar social inclusivo.

Turismo como multiplicador de empregos
O presidente do Grupo Banco Mundial descreveu Moçambique como um “país abençoado”, destacando a combinação rara de praias, biodiversidade e hospitalidade da população. Para Banga, o turismo deve ser uma prioridade nacional, não apenas pelo potencial económico, mas como motor de inclusão social e criação de emprego. “O turismo é o maior multiplicador de empregos por cada dólar investido. Vamos trabalhar com o Presidente num plano que abranja destinos de negócios e de conferências, destinos sociais e de casamento e, por último, o turismo sustentável de elevado valor. Mais uma vez, têm todos os atributos necessários: vida selvagem, praias, campos de golfe”, afirmou, sublinhando que cada segmento do sector deve ser explorado de forma integrada para gerar empregos de qualidade e oportunidades para jovens e mulheres.
Para o Banco Mundial, outro potencial reside na população jovem e em crescimento. É imperativo garantir empregos de qualidade, acesso a formação técnica e inclusão social
A aposta no turismo, segundo a visão do Banco Mundial, vai além do simples desenvolvimento de “resorts” ou atracções isoladas. Trata-se de uma estratégia de longo prazo que liga infra-estruturas, capacitação profissional, preservação ambiental e promoção internacional, transformando Moçambique num destino competitivo e sustentável. Esta abordagem visa ainda potenciar a economia local, estimular pequenas e médias empresas (PME) e criar cadeias de valor ligadas a serviços turísticos, transporte, artesanato e gastronomia, garantindo que o crescimento económico beneficie directamente as comunidades.
É preciso rapidez na execução de planos
O Banco Mundial reconhece, no entanto, a lentidão dos processos de apoio em diferentes domínios da cooperação bilateral e prometeu acelerar resultados. O presidente desta instituição apontou, como exemplo, os grandes projectos de infra-estruturas, como barragens, que exigem tempo, tecnologia e gestão de impactos sociais e ambientais. “É preciso encontrar uma forma de fazer com que as coisas andem depressa. Quando se constrói uma barragem é preciso não só a tecnologia e o equipamento, mas também preocupação com o impacto social e ambiental. O que penso que vai mudar neste processo é o novo quadro de parceria nacional que estamos a criar, que reflectirá uma visão a cinco anos e as prioridades”, garantiu. Segundo o presidente do BM, assegurar apoio a pequenos empreendedores deve ser ainda mais urgente. “Ajudar pequenos empreendedores e empresários deve ser mais importante do que construir uma barragem”, defendeu.
Dividendo demográfico como oportunidade
Para o Banco Mundial, outro potencial reside na população jovem e crescente, lembrando que esta característica demográfica representa um verdadeiro dividendo, mas também um desafio urgente. “Têm uma nação jovem e em crescimento. E esse é o vosso dividendo. Não temos 30 anos para fazer isto correctamente. Porque se os jovens não tiverem esperança, farão coisas que não queremos, incluindo a migração para outros locais e [provocar] instabilidade”, alertou Banga, enfatizando que o futuro do País depende da capacidade de gerar oportunidades reais e dignas. Segundo o responsável, é imperativo garantir empregos de qualidade, acesso a formação técnica e académica e inclusão social, de modo a transformar o potencial demográfico em desenvolvimento sustentável. A aposta estratégica na qualificação da juventude não só fortalece a economia, como também contribui para a coesão social, redução da migração forçada e prevenção da instabilidade, consolidando Moçambique como um país preparado para enfrentar os desafios do século XXI.
O desafio da confiança internacional
O relançamento da parceria não é alheio ao contexto internacional. Moçambique, após anos de turbulência financeira e perda de credibilidade no mercado global, procura reconstruir a confiança junto dos parceiros e investidores. O Banco Mundial, ao renovar o seu compromisso, transmite um sinal de confiança no País e nas reformas em curso. Esta reposição de credibilidade é decisiva para atrair novos fluxos de capital, diversificar a economia e consolidar a estabilidade macroeconómica, factores essenciais para uma trajectória sustentável de crescimento.

Texto: Celso Chambisso • Fotografia: D.R.



























































