O Tribunal Administrativo (TA) revelou a existência de uma discrepância superior a 33,6 milhões de dólares (2,1 mil milhões de meticais) nas receitas provenientes da exploração de gás natural em Moçambique. A informação consta do Relatório e Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2023, submetido esta quinta-feira (15) ao debate na Assembleia da República.
Segundo o documento, o montante depositado na Conta Transitória referente às receitas do gás foi de 60,6 milhões de dólares (3,8 mil milhões de meticais), ao passo que o balanço do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado (PESOE) do primeiro trimestre de 2024 reporta 94,2 milhões de dólares (6 mil milhões de meticais), revelando assim um desvio não justificado de 33,6 milhões de dólares (2,1 mil milhões de meticais).
O relatório destaca também que, em violação da Lei n.º 29/2022, o Governo não transferiu os 2,75% das receitas da produção petrolífera e mineira para as comunidades afectadas, nem os 7,25% destinados a projectos estruturantes provinciais. Esta omissão constitui, segundo o TA, uma inobservância clara do disposto no Plano Económico e Social e representa uma falha grave na redistribuição de recursos provenientes da indústria extractiva.
Entre outras irregularidades identificadas, constam a movimentação de recursos públicos fora do circuito normal de execução orçamental, a retenção e utilização indevida de receitas consignadas e a omissão, na Conta Geral do Estado, dos valores recebidos pelas exportações de gás natural da bacia do Rovuma.
O relatório faz parte de um conjunto de 65 constatações apresentadas pelo Tribunal, que aponta igualmente para a fraca actuação da auditoria interna tanto ao nível das entidades auditadas como ao nível central da Administração Pública, e para a reincidência no pagamento de despesas sem documentos justificativos.
As conclusões provocaram fortes reacções parlamentares. Para a Renamo, o relatório revela uma conta “viciada”, conforme declarou o deputado Fernando Lavieque, que descreveu o caso como “mais uma festa do saque” face à ausência de clareza e rigor contabilístico.
Mangaze Manuel, do Podemos, criticou o facto de sectores como saúde, educação e agricultura continuarem a receber menos do que o previsto, enquanto os fundos da indústria extractiva são mal geridos. Apontou ainda que o processo orçamental “continua frágil e pouco transparente”.
Pela Frelimo, o deputado Raimundo Diomba reconheceu os desafios na governação financeira, sublinhando que as receitas do gás do Rovuma representam uma oportunidade estratégica para o desenvolvimento do País, apelando à implementação de mecanismos mais robustos de controlo.
O MDM acrescentou que foram detectadas transferências orçamentais não autorizadas para as províncias de Niassa, Manica, Gaza e Maputo, o que reforça a necessidade de responsabilização administrativa e legal.
Diante do cenário descrito pelo Tribunal, as bancadas da oposição declararam não estarem criadas condições para aprovar a Conta Geral do Estado de 2023, e recomendaram ao actual Governo que evite a repetição destes erros, reforçando a transparência e a responsabilização na gestão dos recursos públicos.
Fonte: O País