De acordo com o prometido pelo Presidente da República, Daniel Chapo, durante o discurso de balanço dos 100 dias de governação, está já a decorrer uma nova fase do processo de reestruturação da transportadora Linhas Aéreas de Moçambique (LAM). Para o efeito, foi afastada, nesta terça-feira (13), a administração que estava à frente da empresa e nomeada uma nova comissão de gestão.
Segundo um comunicado recebido pelo Diário Económico, a decisão, anunciada pelo Instituto de Gestão das Participações do Estado (IGEPE), foi tomada em assembleia-geral extraordinária da LAM, com efeitos imediatos para a cessação de funções do presidente do Conselho de Administração (PCA) Marcelino Gildo Alberto e dos administradores dos pelouros das Finanças, Recursos Humanos e Serviços Corporativos, Altino Xavier Mavile, e do Técnico e Operacional, Bruno Miranda.

A nota avança ainda a aprovação da nomeação de um conselho de administração não executivo, composto por representantes das empresas estatais que, este ano, passaram a ser accionistas da companhia aérea, nomeadamente a Portos e Caminhos-de-Ferro de Moçambique (CFM), a Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB) e a Empresa Moçambicana de Seguros (Emose).
Foi ainda aprovada a nomeação de uma “comissão de gestão, subordinada ao conselho de administração não executivo, com funções executivas, encarregada de conduzir a gestão da empresa e garantir a continuidade das operações”, e que será presidida por Dane Kondic, antigo director-executivo da Air Serbia e ex-presidente do conselho de administração da portuguesa EuroAtlantic.

Daniel Chapo afirmou, recentemente, que há “raposas e corruptos” dentro da empresa Linhas Aéreas de Moçambique, que possuem “conflitos de interesse” e que impediram a reestruturação da companhia de acordo com o previsto no plano dos primeiros 100 dias de governação.
Há vários anos que a LAM enfrenta problemas operacionais relacionados com uma frota reduzida e falta de investimentos, com registo de alguns incidentes, não fatais, associados por especialistas à deficiente manutenção das aeronaves.
Dados apontam que, só em 2021, a LAM registou um prejuízo de mais de 1,4 mil milhões de meticais (21,7 milhões de dólares), em 2022 com 448,6 milhões de meticais (6,9 milhões de dólares), em 2023 com 3,9 mil milhões de meticais (60,5 milhões de dólares) e em 2024 com registo de 2,2 mil milhões de meticais (34,1 milhões de dólares).
Em Fevereiro, o Executivo anunciou a alienação de 91% das acções do Estado na companhia aérea através de negociação particular. O valor estimado a ser arrecadado com a venda das acções do Estado, cerca de 130 milhões de dólares (8,3 mil milhões de meticais), deverá ser destinado à aquisição de oito novas aeronaves e à reestruturação da empresa.
Diferendos com a EuroAtlantic
Em Março, a companhia portuguesa EuroAtlantic Airways (EAA) anunciou ter rescindido o contrato com a LAM, devido ao incumprimento da transportadora “no pagamento das suas substanciais dívidas financeiras”. A empresa explicou na altura que as dívidas foram contraídas no âmbito do retorno da ligação entre Maputo e Lisboa. “A EAA iniciou a operação desta rota em Dezembro de 2023, e somente foi informada da suspensão repentina de todos os serviços nesta rota a 11 de Fevereiro de 2025”, observou.
“No âmbito da reestruturação, decidimos rescindir o contrato com a EuroAtlantic. A empresa exigiu 21 milhões de dólares, mas após uma análise detalhada das cláusulas contratuais, concluiu-se que o montante justo, nomeadamente o valor de pré-aviso, ronda os três milhões de dólares. A equipa técnica ainda está a trabalhar, mas esse é o valor que temos”, explicou o governante.
Abandonada pela companhia por quase 12 anos, a rota Maputo-Lisboa foi retomada em Dezembro de 2023 e fazia parte do plano de revitalização da operadora moçambicana, após a sul-africana Fly Modern Ark (FMA) ter assumido a sua gestão para ajudar no processo de reestruturação. O transporte era assegurado por um Boeing 777 de 302 lugares, resultante de uma parceria com a operadora EuroAtlantic.

Sul-africana Fly Modern Ark leva LAM a justiça
A acção refere-se a um projecto de reestruturação que a FMA realizou para a companhia moçambicana entre 2023-2024. A batalha judicial adiciona mais complexidade às constantes dificuldades da LAM em relação à eficiência operacional e à estabilidade financeira, impactando negativamente nas actividades das agências de viagens em toda a África Austral.
Em Abril de 2023, quando a Fly Modern Ark assumiu a gestão da companhia (cujo contrato findou em Setembro de 2024), reconheceu que a mesma tinha uma dívida estimada de 300 milhões de dólares e, ao longo dos trabalhos realizados, a entidade sul-africana denunciou esquemas de desvio de dinheiro na LAM, com prejuízos de mais de 3 milhões de dólares, em lojas de venda de bilhetes, através de máquinas dos terminais de pagamento automático (TPA/POS) que não eram da companhia.
Auditoria forense às contas da LAM
Recentemente, o Executivo de Daniel Chapo comunicou que vai avançar com uma auditoria forense às contas da empresa referentes aos últimos dez anos, um processo que será concluído em menos de seis meses. Na sequência, uma fonte governamental admitiu ainda que será necessário, igualmente, “reduzir o número de trabalhadores” da companhia, dos actuais cerca de 800, devido à frota reduzida.
Em reacção, a Fly Modern Ark manifestou abertura para cooperar na auditoria forense às contas da empresa aérea, tendo elucidado que o problema da LAM está ligado a supostas “redes internas responsáveis pelo roubo e pela má gestão”, acusando a transportadora nacional de violar o acordo entre as partes ao pagar só a metade da factura final.

O Governo rejeitou que os actuais prejuízos da LAM sejam uma consequência da gestão da FMA. “As perdas registadas são o reflexo de muitos anos de dificuldades acumuladas, não se podendo, de forma isolada, imputar os resultados negativos apenas à gestão da Fly Modern Ark”, avançou o ministro dos Transportes e Logística, João Matlombe.
Saiba quem é Dane Kondic, o novo responsável pela gestão da LAM
É um executivo australiano, nascido em Sidney, com raízes sérvias, com bastante experiência no sector de aviação civil pelo mundo. Foi o primeiro CEO da Companhia Air Serbia, tendo passado pela EuroAtlantic. Kondic foi antes gestor de desenvolvimento de negócios na Quantas, da Austrália, no final dos anos 90, e também trabalhou na Malaysia Airlines por quase quatro anos.
Depois, actuou como director regional para o sudeste da Ásia na Sabre Airline Solutions. Antes disso, foi também vice-presidente comercial da Abacus International na Ásia, tendo passado ainda pela GTA, parte da Travelport, e pela Kuoni Travel da China.
Texto: Cleusia Chirindza