O Governo sul-africano comunicou oficialmente o seu desagrado à administração norte-americana, depois de ter confirmado que Washington vai receber os primeiros afrikaners brancos – grupo étnico descendente de colonos, principalmente holandeses, alemães, franceses e outros países europeus, que se estabeleceram na África do Sul no século XVII – como refugiados já nesta semana.
De acordo com um documento consultado pela BBC, os cidadãos em causa serão recebidos no âmbito de um programa de reinstalação descrito como uma “prioridade” da administração do Presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Donald Trump.
A medida faz parte da acusação feita por Trump, em Fevereiro deste ano, que afirma haver “discriminação racial” contra os sul-africanos brancos, especialmente os agricultores de origem Afrikaner, abrindo a possibilidade de se reinstalarem nos EUA.
De acordo com um comunicado publicado na sexta-feira (9) pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros da África do Sul, a alegada medida é descrita como “politicamente motivada” e destinada a minar a “democracia constitucional” sul-africana. Apesar das críticas, o Governo deixou claro que não impedirá a saída dos cidadãos que decidirem deixar o país, mas procurou obter garantias dos EUA de que as mesmas não tinham acusações criminais pendentes.
Na mesma declaração, as autoridades reiteraram que, ainda que houvesse sinais de discriminação, não haveria o grau de perseguição exigido pelo direito internacional e pelas leis nacionais de refugiados.
A administração Trump também acusou a África do Sul de confiscar terras de agricultores brancos sem indemnização, algo que Pretória negou repetidamente. Alguns grupos que representam os direitos dos agricultores brancos afirmaram que estes estão a ser deliberadamente mortos devido à sua raça.
A nota acrescenta que as alegações de discriminação contra a minoria branca do país eram “infundadas” e que as estatísticas criminais não indicavam que qualquer grupo racial tivesse sido alvo de crimes violentos nas explorações agrícolas.

O empresário Elon Musk, um dos principais conselheiros da administração Trump que cresceu na África do Sul durante o apartheid (sistema de segregação racial e discriminação legalizada que vigorou em 1948-94), tem criticado Pretória, afirmando que está a liderar um “genocídio” contra os agricultores brancos.
Reportagens publicadas pelo New York Times e pela National Public Radio indicam que as primeiras reinstalações deverão ocorrer já nesta segunda-feira (12), com 54 afrikaners a fazerem parte do primeiro grupo. Um memorando citado pelo site de investigação The Lever aponta que até mil cidadãos poderão ser aceites nos EUA este ano.
A decisão de aceitar sul-africanos como refugiados surge numa altura em que a administração Trump suspendeu quase todos os pedidos de asilo de migrantes.
Em Fevereiro, a África do Sul criticou a ordem executiva de Trump que abre os EUA à reinstalação de afrikaners brancos, afirmando, em comunicado, que “é irónico” que o país esteja aberto a aceitar um grupo “que permanece entre os mais privilegiados economicamente”, enquanto nega asilo a pessoas vulneráveis de outras partes do mundo.