As tarifas impostas pelos Estados Unidos da América (EUA) têm efeitos limitados no comércio directo com a África Subsaariana, mas as consequências económicas e políticas mais amplas podem ser profundas em toda a região, alertou Jane Morley, responsável pelos países de risco para a região na BMI, empresa multinacional britânica de investigação e filial da Fitch Solutions.
Durante um webinar realizado a 23 de Abril, Morley explicou que, apesar dos debates em curso sobre possíveis ajustes às tarifas, é improvável que estes sejam totalmente revertidos. Tal cenário reflecte uma mudança estrutural na política comercial do Presidente norte-americano Donald Trump, centrada na geração de receita, no fortalecimento das cadeias de suprimentos e na atracção de investimentos.
De acordo com Morley, os EUA estão interessados em negociar acordos bilaterais para reduzir a taxa média dos direitos aduaneiros, actualmente em 25%. No entanto, os progressos têm sido limitados, especialmente em sectores como os semicondutores e os produtos farmacêuticos, o que poderá levar a compromissos noutras áreas.
Embora Trump reconheça os riscos para a economia interna dos EUA, incluindo uma possível recessão e impactos eleitorais em 2026, as tarifas elevadas – especialmente as aplicadas à China – deverão manter a média acima dos 20%, de acordo com as projecções da BMI.
A instituição identifica quatro canais principais através dos quais estas tarifas afectam o crescimento global: redução dos fluxos comerciais, queda do investimento empresarial, diminuição da riqueza das famílias e restrições ao crédito. Consequentemente, as previsões de crescimento foram revistas em baixa para as principais economias, como os EUA, a China e a Alemanha, bem como para vários países africanos.
Jane Morley salientou que todos os 49 países da África Subsaariana estão sujeitos a uma tarifa de base de 10% sobre as exportações para os EUA, com excepção de produtos como o petróleo e os minerais essenciais. No entanto, o aço e os automóveis estão sujeitos a direitos aduaneiros de 25%, e a taxa efectiva varia muito de país para país.
Embora o comércio entre os EUA e a África Subsaariana seja modesto – representando apenas cerca de 4% do total das exportações da região – alguns países, como o Lesoto e Madagáscar, são particularmente vulneráveis devido à sua dependência das exportações de vestuário, um sector sensível a variações nos custos de acesso ao mercado norte-americano.
Além disso, a responsável sublinhou que os efeitos indirectos dos direitos aduaneiros, como a queda dos preços das matérias-primas, são potencialmente mais prejudiciais. A redução do valor do cobre, por exemplo, já está a ter impacto em economias como a Zâmbia e a República Democrática do Congo (RDC), enquanto os preços do petróleo – que caíram mais de 7% no último mês – estão a pressionar países exportadores como Angola, Gabão e Congo-Brazzaville.

O crescimento dos rendimentos das euro-obrigações praticamente excluiu países como a Nigéria, o Quénia e o Gana dos mercados internacionais, forçando-os a contrair dívida interna, o que aumenta os encargos com juros e limita a sua capacidade de investir nos serviços públicos e no desenvolvimento.
Esta pressão orçamental, combinada com a instabilidade económica, pode aumentar o risco de agitação política. A perda de postos de trabalho, a diminuição das receitas e a frustração popular alimentam as tensões já existentes, especialmente em países com um historial de instabilidade, como a RDC, onde a descida do preço do cobre põe em risco as operações militares contra os grupos rebeldes.
Entretanto, a situação é agravada por uma dinâmica preocupante no sector informal do ouro, cujos preços elevados beneficiam as facções rebeldes. O aumento do valor do metal amarelo reforça o poder de financiamento e expansão destes grupos, nomeadamente nas províncias orientais da RDC, onde existe uma correlação entre os preços e os incidentes de segurança.
Jane Morley concluiu alertando para o facto de países como o Sudão do Sul e Moçambique também enfrentarem riscos elevados. A queda dos preços do petróleo ameaça a estabilidade do Governo do Sudão do Sul, enquanto em Moçambique, a combinação de tensão política, desafios fiscais e volatilidade da moeda pode reacender os protestos populares.
Fonte: Engineering News