A experiência ganesa na implementação de políticas de conteúdo local foi destaque esta quinta-feira (8) no segundo dia da 11.ª Conferência e Exposição de Mineração e Energia de Moçambique (MMEC 2025), dedicado à partilha de perspectivas internacionais sobre reformas legais e boas práticas na gestão dos recursos naturais.
Em representação da Ghana Petroleum Commission, Priscilla Boasiako, directora para Transferência de Tecnologia e Estratégia, apresentou o modelo que permitiu ao Gana aumentar a participação efectiva de empresas nacionais na indústria petrolífera.
Segundo Boasiako, o ponto de viragem ocorreu após a descoberta de petróleo em 2007, quando o Governo ganês reconheceu que menos de 6% dos bens e serviços da indústria eram fornecidos por empresas locais.
“Percebemos que as empresas multinacionais evitavam contratar localmente com o argumento de que o país não tinha capacidade técnica. Quisemos mudar essa narrativa com uma lei de conteúdo local, mas, sem mecanismos práticos, a implementação seria limitada”, afirmou.
A responsável explicou que o Gana optou por uma abordagem pragmática, centrada na colaboração com operadoras e grandes prestadores de serviços. Uma das medidas estruturantes foi a desagregação de contratos complexos, tradicionalmente concentrados em grandes empreiteiros internacionais, tornando-os acessíveis a pequenas e médias empresas locais.
“Começámos a dividir grandes contratos em pacotes menores, com apoio técnico das próprias operadoras. Isso permitiu que empresas ganesas com menor capacidade financeira pudessem competir e executar partes específicas dos projectos”, detalhou.
Além da desagregação contratual, o Gana introduziu cláusulas obrigatórias de parceria local. Em cada contrato, exige-se a presença de uma empresa ganesa como parceira de referência, com pelo menos 10% de participação accionista. Paralelamente, são definidos requisitos mínimos de formação, emprego, transferência de tecnologia e aquisição de bens e serviços no mercado interno.
“Não se trata apenas de contratar, mas de garantir que a actividade deixe valor real no país. Exigimos, por exemplo, que cada contrato traga planos concretos de formação, investigação e desenvolvimento local”, acrescentou.
A representante reconheceu, no entanto, que o processo enfrentou desafios, nomeadamente práticas de rentismo por parte de algumas empresas locais, que, em vez de se capacitarem, limitaram-se a cobrar comissões sem gerar valor. Também referiu resistências das empresas estrangeiras no que toca à propriedade intelectual e transferência de tecnologia, mas sublinhou que a colaboração contínua com estas tem permitido avanços graduais.
Boasiako defendeu ainda que o foco das políticas deve estar na retenção de valor económico dentro do país, mais do que na simples percentagem de propriedade de empresas: “Ter uma empresa com 100% de capital nacional não significa nada se ela importar tudo de fora. Já vimos empresas estrangeiras, através de ‘joint-ventures’, a fabricarem no país, a empregar ganeses e a criarem cadeias de valor locais reais. O essencial é saber onde o valor fica.”
Concluindo a sua intervenção, a dirigente do Ghana Petroleum apelou a Moçambique para adoptar uma abordagem prática e orientada para resultados, com metas claras, incentivos bem desenhados e envolvimento directo dos agentes de execução, como as operadoras e empresas de serviços.
O painel contou com peritos internacionais que partilharam exemplos de reformas legais bem-sucedidas noutros países africanos, destacando-se os casos em que quadros jurídicos robustos resultaram em benefícios económicos e sociais mensuráveis para as populações.
O evento conta com a participação de representantes governamentais, empresários, académicos, reguladores e parceiros internacionais de desenvolvimento. Entre os temas em debate destacam-se a atracção de financiamento para infra-estruturas energéticas, a valorização local de minerais, o papel da energia na agricultura e turismo e a construção de corredores industriais transfronteiriços.