A Polícia da República de Moçambique (PRM) admitiu ter utilizado balas reais durante as manifestações que se seguiram às eleições de Outubro de 2024, mas justificou o uso dessas munições como resultado de “circunstâncias involuntárias” e, em alguns casos, “proporcionais” à gravidade dos confrontos.
“Na componente da dispersão ou controlo de massas são usados meios legítimos de dispersão. As balas verdadeiras (…) são em circunstâncias involuntárias e, às vezes, até em circunstâncias de proporcionalidade”, declarou Leonel Muchina, porta-voz do comando-geral da PRM, citado pela comunicação social.
Desde as eleições gerais de 2024, Moçambique tem vivido um clima de elevada tensão social, com manifestações e paralisações convocadas pelo ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, que não reconhece os resultados eleitorais que deram a vitória a Daniel Chapo. As manifestações degeneraram, em vários pontos do País, em confrontos entre manifestantes e forças de segurança.
Segundo a PRM, durante esses episódios foram incendiadas viaturas e outros bens públicos, sobretudo através de artefactos incendiários improvisados. “Nós vimos em muitos cenários objectos e viaturas policiais a serem incendiados a partir de bombas caseiras, chamadas de ‘cocktail molotov’. Estas são armas e precisam de ser repelidas de forma proporcional”, afirmou Muchina.
O porta-voz acrescentou que, nos casos em que não foi possível aplicar uma resposta proporcional, a actuação da polícia teve de recorrer a meios involuntários, tendo sido criadas equipas de inquérito para apurar os contextos específicos de cada incidente.
“Para todas estas questões, houve a necessidade de constituição de equipas de inquérito que foram aprofundar em que circunstâncias esses incidentes ocorreram, para efectivamente encontrar-se melhoria na actuação dos nossos agentes”, explicou.
A declaração surge dias após a publicação de um relatório da Amnistia Internacional, que acusou as forças de segurança moçambicanas de uso excessivo da força contra manifestantes pacíficos e transeuntes, incluindo crianças. A organização referiu que a resposta da polícia foi “desproporcionada e vergonhosa”, destacando o uso de balas reais, gás lacrimogéneo e balas de borracha.
A Amnistia relatou ainda detenções arbitrárias em massa, intimidação de jornalistas e restrições no acesso à Internet durante momentos-chave dos protestos. De acordo com dados da Plataforma Decide, uma organização da sociedade civil moçambicana, pelo menos 388 pessoas morreram desde o início dos protestos a 21 de Outubro, entre as quais cerca de duas dezenas de menores.
O Governo moçambicano, no entanto, reconhece oficialmente 80 óbitos e regista, além disso, a destruição de 1677 estabelecimentos comerciais, 177 escolas e 23 unidades sanitárias durante os confrontos. A 23 de Março, Daniel Chapo e Venâncio Mondlane encontraram-se pela primeira vez desde as eleições e comprometeram-se a promover o fim da violência no País.
Fonte: Lusa