A imposição de tarifas comerciais elevadas pelos Estados Unidos sobre produtos provenientes da União Europeia e da China está a redesenhar as dinâmicas do comércio internacional e a lançar incertezas sobre a economia global. Contudo, economistas contactados pelo DE apontam que o impacto para Moçambique pode ter efeitos duplos — com riscos a longo prazo, mas também oportunidades no curto prazo.
De acordo com o economista Egas Daniel, esta nova escalada protecionista poderá causar uma fragmentação crescente das trocas comerciais, encarecendo os produtos importados e reduzindo a competitividade global. “Com os Estados Unidos a impor tarifas que chegam até 104% sobre produtos chineses, a procura global tende a desacelerar, o que pode resultar na queda do preço de matérias-primas como o petróleo”, explica Daniel, esclarecendo que esse cenário pode beneficiar países importadores líquidos de combustíveis fósseis, como Moçambique, ao reduzir os custos de importação.
No entanto, Egas Daniel adverte que uma recessão global induzida por esta guerra comercial poderá também reduzir a procura por produtos que Moçambique exporta — como carvão, gás natural e alumínio — impactando negativamente as receitas de exportação e a balança comercial do País. “Estamos diante de um equilíbrio delicado: o que se ganha com a queda dos preços dos combustíveis pode-se perder com a desvalorização das nossas exportações”, sublinha.
O economista Clésio Foia reforça esta visão, explicando que os impactos desta guerra tarifária não se limitam às grandes potências. “Moçambique pode ser afectado indiretamente, pois as cadeias de valor globais estão interligadas. Se as empresas chinesas e europeias forem forçadas a procurar mercados alternativos, produtos mais baratos poderão entrar em África, pressionando os produtores locais moçambicanos e desequilibrando o mercado”, alerta Foia.
Além disso, a instabilidade nos mercados internacionais poderá exercer pressão sobre o metical e causar inflacção importada, agravando o custo de vida no País. O aumento do preço de máquinas, fertilizantes e outros bens de capital importados, devido à volatilidade comercial, pode colocar em risco sectores como a agricultura e a construção civil.
Por outro lado, a tensão comercial pode abrir janelas estratégicas para países emergentes. Com o recuo das grandes economias em algumas cadeias produtivas, há espaço para Moçambique e outras nações africanas assumirem novos papéis na geopolítica económica global, desde que haja investimentos certos, melhorias na competitividade e na infra-estrutura logística.
Contudo, Foia adverte que o actual contexto internacional é marcado por elevada incerteza. “A retórica de independência económica dos EUA, que visa reindustrializar internamente e reduzir a dependência da China, pode ser insustentável no longo prazo. Ao mesmo tempo, acelera a fragmentação do sistema económico global e incentiva o surgimento de blocos alternativos como os BRICS, o que pode isolar os EUA e alterar profundamente a ordem económica mundial”, disse.
Neste cenário, o País deve adoptar uma postura proactiva e estratégica: diversificar os seus parceiros comerciais, investir em cadeias de valor locais e melhorar o ambiente de negócios para atrair mais investimento directo estrangeiro. O País também precisa reforçar a sua resiliência económica perante choques externos, apostando na industrialização leve e na transformação local de recursos.
Economista reiteram que a nova guerra comercial entre EUA, China e UE é um fenómeno complexo e multifacetado, que combina riscos sistémicos com oportunidades pontuais. Para Moçambique, o desafio será navegar entre estes extremos, maximizando os benefícios de curto prazo, como a redução do custo dos combustíveis, e minimizando os impactos negativos sobre as exportações, inflacção e investimento externo. O momento exige liderança económica lúcida, políticas públicas robustas e visão estratégica para o futuro.
Texto: Nário Sixpene