Uma análise realizada pelo Centro de Integridade Pública (CIP) – organização da sociedade civil – concluiu que a venda da empresa Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) à Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB), à Portos e Caminhos-de-Ferro de Moçambique (CFM) e à Empresa Moçambicana de Seguros (EMOSE) pode agravar o risco fiscal do sector e reduzir a transparência na gestão dos recursos públicos.
O CIP explica que a LAM é uma empresa tecnicamente insolvente e altamente dependente de suporte financeiro do Estado. “De acordo com as demonstrações financeiras de 2018 a 2021, a companhia registou prejuízos sistemáticos ao longo do período, atingindo em 2021 um resultado líquido negativo superior a 20,7 mil milhões de meticais (324 milhões de dólares). Além disso, apresentou um capital próprio negativo de 18,2 mil milhões de meticais (285 milhões de dólares) e uma dívida líquida ajustada de 17,4 mil milhões de meticais (272 milhões de dólares).”
A organização realça a falta de continuidade da publicação do relatório e contas por parte da empresa. “Apesar da obrigatoriedade estabelecida no artigo 29 da Lei do SEE (Lei n.º 3/2018, de 19 de Junho), que exige a publicação e auditoria das contas das empresas do sector, a LAM não divulga os seus relatórios de demonstrações financeiras desde 2021, o que pode sinalizar uma falta de transparência por parte da empresa.”
No que diz respeito a apoios financeiros do Estado, a organização, citando o relatório das demonstrações financeiras da empresa de 2021, revela que, em 2020, a LAM beneficiou de 1,6 mil milhões de meticais (25 milhões de dólares) em injecção de capital, por reversão dos valores inscritos nas prestações suplementares, e 75,6 milhões de meticais (1,2 milhões de dólares) em subsídios. Em 2021, a empresa voltou a beneficiar de 100 milhões de meticais (1,6 milhões de dólares) em injecção de capital.
Além dos relatórios da companhia aérea, a organização cita o Relatório de Riscos Fiscais 2025 (publicado em 2023), no qual a LAM recebeu um subsídio governamental de 255,4 milhões de meticais (4 milhões de dólares). O relatório da dívida pública do terceiro trimestre de 2024 indica que transportadora enfrenta dificuldades para honrar os seus compromissos financeiros com os credores e, até ao terceiro trimestre de 2024, a sua dívida ascendia a mais de 7,1 mil milhões de meticais (111 milhões de dólares).

“O Relatório de Riscos Fiscais 2025 classifica a empresa como de alto risco fiscal, destacando a sua dependência de intervenção estatal e o risco de o Estado ser chamado a resgatar qualquer garantia emitida a seu favor”, destaca a organização.
O CIP lembra ainda que, em Abril de 2023, quando a Fly Modern Ark (FMA) assumiu a gestão da LAM com a finalidade de a revitalizar, a dívida da companhia ascendia a aproximadamente 300 milhões de dólares (19,2 mil milhões de meticais). No momento da sua saída, em Setembro de 2024, a FMA declarou que a LAM necessitava urgentemente de uma injecção financeira superior a 10 milhões de dólares (640 milhões de meticais) para garantir a continuidade das operações, evidenciando que a situação financeira da companhia ainda era alarmante.
A organização esclarece que a relação financeira entre o Estado e o SEE materializa-se através de transferências financeiras do Governo para as empresas do sector – via subsídios, emissão de garantias soberanas, cartas de conforto, acordos de retrocessão, avales e resgates do serviço da dívida. “Em contrapartida, as empresas contribuem para o Orçamento do Estado (OE) por meio do pagamento de impostos e distribuição de dividendos. Esta relação pode representar risco fiscal se as saídas de recursos financeiros do Estado superarem as contribuições financeiras das empresas”, alerta o CIP.
De acordo com as demonstrações financeiras de 2018 a 2021, a companhia registou prejuízos sistemáticos ao longo do período, atingindo em 2021 um resultado líquido negativo superior a 20,7 mil milhões de meticais (324 milhões de dólares). Além disso, apresentou um capital próprio negativo de 18,2 mil milhões de meticais (285 milhões de dólares) e uma dívida líquida ajustada de 17,4 mil milhões de meticais (272 milhões de dólares)
“Por fim, a LAM possui um histórico de corrupção e má administração, conforme denunciado pela FMA. Entre as acções fraudulentas destacam-se o desvio de fundos, a aquisição de imóveis em benefício de terceiros, a existência de contas bancárias no exterior e pontos de venda de bilhetes (POS) operados por indivíduos sem vínculo com a empresa. A situação mais recente foi a devolução de uma aeronave de carga que custou à transportadora mais de 3,9 milhões de dólares (240 milhões de meticais)”, refere a análise.
No entender da organização, o cenário exposto indica que, mais do que uma simples injecção de capital, a LAM necessita de uma profunda reestruturação administrativa, acompanhada de melhorias nos processos de transparência e responsabilização dos gestores.
Para que a reestruturação do sector seja eficaz, o CIP defende ser fundamental a adopção de medidas que reduzam a interferência política e governamental na gestão da empresa. Sugere também a formação de uma parceria público-privada, com a entrada de um investidor estratégico forte como uma solução para mitigar os riscos associados à influência política e governamental e promover uma gestão mais eficiente e sustentável.