O bairro de Hulene A, na cidade de Maputo, está a sofrer o impacto de dois ciclones consecutivos que, em conjunto, mataram mais de 130 pessoas em todo o País nos últimos meses.
Moçambique surge em algumas análises do Banco Mundial entre os dez países “mais vulneráveis a nível global” ao impacto das alterações climáticas. De acordo com o site do jornal Público, analistas dizem que as finanças públicas com pouca capacidade e infra-estrutura deficientes fazem com que as inundações frequentes se tornem um desafio particularmente difícil de enfrentar.
“Um perigo mortal”
O receio de contrair doenças devido à água estagnada levou alguns moradores, como Jorge Raul, a pedirem ajuda dos seus familiares, para que estes cuidassem dos seus filhos. No entanto, nem todos têm a mesma chance. Aida Lúcio também vive em Hulene e contou que ela e a sua filha tinham acabado de recuperar de um ataque de malária e que se pudessem mudar-se o fariam. “Estamos a correr um perigo mortal”, afirmou.
Segundo o Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres (INGD), só no mês de Dezembro, cerca de 120 pessoas perderam a vida por conta do ciclone Chido. Em Janeiro, o ciclone Dikeledi tirou a 11 pessoas. Devido ao fenómeno meteorológico La Niña, que envolve o arrefecimento da água à superfície no oceano Pacífico e tem efeitos um pouco por todo o planeta, o Instituto Nacional de Meteorologia revelou que o País ainda enfrentará mais chuvas este ano.
Cerca de 250 mil pessoas foram afectadas pelo ciclone Dikeledi, ultrapassando as 76 mil previstas pelo INGD. O Governo abriu quatro abrigos onde estão alojadas 1200 pessoas, mas receia-se que não haja dinheiro suficiente para satisfazer a procura dos afectados pelos fenómenos meteorológicos extremos. Segundo o Público, o INGD disse que tinha um “buraco” no valor de nove mil milhões de meticais no fundo do Plano de Contingência – o financiamento que recebe do Estado e dos doadores internacionais para fazer face a emergências nacionais – para enfrentar as despesas que prevê ter durante esta estação das chuvas.
Moçambique surge em algumas análises do Banco Mundial entre os dez países “mais vulneráveis a nível global” ao impacto das alterações climáticas
Face à falta de ajuda, os moradores de Hulene A estão a tentar resolver os problemas pelas suas próprias mãos, abrindo valas para conduzir a água para bacias de retenção naturais – áreas de terreno muito baixo onde não há casas –, embora isso não seja suficiente para limpar o bairro, de acordo com Carlos Serra Jr, director da organização não-governamental Repensar.
Os ciclones também agravaram a situação no bairro vizinho, Magoanine, que ainda se debatia com as consequências de uma inundação de 2023. Na sequência dessa tragédia, Emília Cardoso vive há dois anos num centro de acolhimento e queixa-se de falta de comida e de casas de banho suficientes para todos os residentes e espera poder regressar a casa um dia. “É difícil viver aqui”, lamenta a mulher de 51 anos.
Até agora, as autoridades municipais têm estado a instalar pequenas motobombas em Magoanine para bombear a água para um pequeno rio próximo. Dentro de um mês, deslocarão a operação de bombagem para Hulene A.
As organizações ambientais querem que as autoridades construam um sistema de drenagem mais eficaz para canalizar as águas pluviais para o oceano Índico, que fica a menos de 15 quilómetros de distância.
Borges José Silva, director executivo da Empresa Municipal de Saneamento e Drenagem de Maputo, garante que a maioria das famílias desalojadas pelas cheias de 2023 poderá regressar às suas casas em Magoanine dentro de um mês. “A demora deve-se à necessidade de se construir um novo sistema de canalização. Vamos bombear a água e criar uma bacia de retenção. Provavelmente, dentro de 30 dias haverá condições para as famílias regressarem às suas casas” afirma.
Protecção ambiental mais rigorosa
Carlos Serrac Jr considera que estas medidas não conseguirão resolver as causas subjacentes das inundações frequentes, como o mau planeamento e a ocupação ilegal ao longo dos cursos de água naturais.
Segundo o responsável da Repensar, “Maputo precisa urgentemente de uma protecção ambiental muito rigorosa e todos temos de intervir, para corrigir os muitos erros que foram cometidos ao longo da história”, disse o ambientalista.
Devido à reestruturação do novo Governo após as eleições, não foi possível obter informações do Ministério responsável pela terra e o ambiente.
Fonte: Público