A Missão de Observação Eleitoral da União Europeia (MOE UE) divulgou o seu relatório final sobre as eleições gerais moçambicanas realizadas em 9 de Outubro de 2024, documento que o Diário Económico consultou esta sexta-feira (31), evidenciando uma série de irregularidades que comprometem a credibilidade do processo. O documento expõe falhas na administração eleitoral, aponta a influência excessiva do partido no poder, a Frelimo, e denuncia a repressão violenta a protestos que contestavam os resultados.
Apesar de a votação ter decorrido de maneira relativamente pacífica, a contagem dos votos e o apuramento dos resultados foram marcados por sérias falhas. A MOE UE relata casos de manipulação dos números, invalidando votos da oposição e alterando resultados para favorecer o partido no poder. A ausência de publicação detalhada dos números por mesa de voto aumentou as suspeitas de fraude, comprometendo a transparência do processo eleitoral.
Os resultados oficiais deram a vitória a Daniel Chapo, candidato da Frelimo, com 65% dos votos (contra os 70% inicialmente divulgados pela Comissão Nacional de Eleições), enquanto Venâncio Mondlane, candidato independente, obteve 24%, tendo sido inicialmente anunciado com 20%.
A oposição, incluindo o Podemos e a Renamo, rejeitou os resultados, apontando irregularidades no recenseamento, na administração do processo e na contagem dos votos. A contestação desencadeou uma onda de protestos que foram brutalmente reprimidos pelas forças de segurança, resultando em pelo menos 300 mortes, segundo o relatório.

O documento detalha que as forças de segurança recorreram a meios desproporcionais para dispersar os manifestantes, violando direitos fundamentais, incluindo o direito à reunião pacífica. Entre as vítimas, destacam-se Elvino Dias, assessor jurídico de Mondlane, e Paulo Guambe, porta-voz do Podemos, assassinados em Maputo por homens armados não identificados.
Outro factor apontado pela missão europeia foi a falta de independência da administração eleitoral. A CNE e o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) foram acusados de favorecer o partido no poder, além de não garantirem a fiscalização necessária para um processo eleitoral justo.
O relatório também questiona as discrepâncias nos números do recenseamento, apontando que algumas províncias registaram mais eleitores do que o total estimado de habitantes aptos a votar, aumentando as suspeitas de fraude.
A parcialidade da media estatal também foi destacada no relatório. De acordo com a MOE UE, os meios de comunicação públicos, como a TVM e a Rádio Moçambique, ofereceram ampla cobertura à Frelimo e ao seu candidato, enquanto limitaram a visibilidade da oposição. Além disso, jornalistas que tentaram investigar e divulgar denúncias de irregularidades enfrentaram intimidação e censura.
Diante deste cenário, a MOE UE apresentou 18 recomendações, incluindo oito prioritárias, que enfatizam a necessidade de uma reforma estrutural da administração eleitoral e o fortalecimento dos mecanismos de transparência. Entre as medidas prioritárias estão a revisão da composição da CNE e do STAE para garantir independência e transparência, a reformulação do sistema de contagem de votos e a publicação detalhada dos resultados.
O relatório também pede que o Governo proteja as liberdades fundamentais, garantindo o direito de reunião e manifestação pacífica, e que a legislação eleitoral seja harmonizada para evitar contradições e ambiguidades.
O relatório final da União Europeia sublinha a urgência de mudanças profundas para restaurar a confiança da população no sistema eleitoral moçambicano. A necessidade de eleições justas, livres e transparentes é essencial para a estabilidade democrática do País, e as recomendações feitas visam corrigir as falhas identificadas, garantindo que futuros processos eleitorais sejam conduzidos de maneira legítima e imparcial.
Texto: Felisberto Ruco