À medida que os bancos europeus se afastam de África, os norte-americanos estão a fazer o oposto, embora ainda estejam de forma relutante na banca de retalho.
Os bancos europeus estão a recuar em África, enquanto os concorrentes norte-americanos avançam. Em Outubro, Jamie Dimon, director executivo do JP Morgan, o maior banco do mundo, afirmou: “Queremos [expandir a nossa presença] em África, a cada dois ou três anos”.
O entusiasmo é partilhado por outros. “África oferece imensas oportunidades para os nossos clientes, particularmente nos sectores dos minerais críticos, tecnologia, energia, recursos naturais e desenvolvimento de infra-estruturas”, salienta Yvonne Ike, responsável pelo negócio do Bank of America (BofA) na África Subsaariana.
Na África francófona, “a Costa do Marfim tem tudo”, diz Ike. “Uma economia diversificada, um sector privado dinâmico, recursos de petróleo e gás e estabilidade cambial. Estamos entusiasmados por estabelecer uma presença mais forte na Costa do Marfim e no Senegal, que também tem grande potencial.”
A crença do maior banco do mundo
O Citigroup prefere deixar os números falarem. Está presente em 12 países africanos, comparado com dois (em breve quatro) do JP Morgan e apenas um do BofA e da Goldman Sachs. O primeiro escritório africano do Citi remonta a 1920, na África do Sul. Contudo, não se espera que clientes particulares possam abrir contas em bancos norte-americanos em
África, num futuro próximo. “A taxa de retorno na banca de retalho geralmente não é muito atractiva”, explica Otaviano Canuto, ex-vice-presidente do Banco Mundial e actualmente investigador sénior no Policy Center for the New South, um think-tank em Marrocos.
O Citigroup, que registou receitas de 20,3 mil milhões USD no terceiro trimestre de 2024, e é liderado por Jane Fraser, possui uma vantagem em África graças à sua longa presença

“Operar neste sector exige conhecimento local” e essa “não é a estratégia dos bancos norte-americanos.” Canuto menciona também os obstáculos regulatórios. “As autoridades dos EUA podem ser implacáveis se algumas transacções ou clientes parecerem pouco transparentes. A análise custo-benefício não favorece uma incursão na banca comercial”, sublinha.
Domínio em fusões e aquisições
Entretanto, Citigroup, Bank of America, JP Morgan e Goldman Sachs têm reforçado serviços corporativos e trabalho de consultoria para governos africanos. No primeiro semestre de 2024, os cinco principais consultores de fusões e aquisições na África Subsaariana foram todos bancos americanos.
Este ano, o gigante sul-africano de televisão Canal+, detido por Vincent Bolloré, contratou o BofA Securities e o JP Morgan como consultores financeiros na aquisição da Multichoice. Os cinco maiores bancos norte-americanos representaram 94% do valor global das transacções no período, segundo dados da LSEG Data & Analytics. O Morgan Stanley liderou com transacções no valor de 15,4 mil milhões de dólares.
O Citigroup, que registou receitas de 20,3 mil milhões de dólares no terceiro trimestre de 2024 e é liderado por Jane Fraser, possui uma vantagem em África graças à sua longa presença, e está determinado em lucrar com esta posição. “A era do Estado todo-poderoso dará lugar ao investimento privado local e estrangeiro”, afirma Papa Sall, director do Citi para a África Ocidental e Central.
“O crescimento do sector privado impulsionará a próxima expansão na maioria dos nossos mercados. Esta é a nossa força natural, porque já servimos essas mesmas multinacionais e grandes empresas locais à medida que se expandem nos sectores das infra-estruturas, agricultura, recursos naturais, saúde, entre outros.”
Em 2022, o Citi concedeu uma linha de crédito rotativa de 125 milhões de dólares à Airtel Africa e ajudou a startup de saúde mPharma do Gana a angariar 35 milhões de dólares. A recente viagem de Jamie Dimon ao continente evidenciou o empenho do JP Morgan em recuperar terreno.
Boom no comércio
Os bancos dos EUA estão preparados para agir assim que a Zona de Comércio Livre Continental Africana (AfCFTA) se materializar. “O JP Morgan ou o Goldman Sachs seguirão o movimento assim que o número de transacções aumentar”, diz Canuto. “Se os mercados de capitais se desenvolverem, particularmente com a integração entre bancos centrais, a relação risco-retorno tornar-se-á muito atractiva.”
Entretanto, os bancos norte-americanos estão a apostar num circuito que já está em ascensão: as ligações financeiras e comerciais entre África e o Médio Oriente.
Em 2022 e 2023, os países do Conselho de Cooperação do Golfo (GCC) financiaram cerca de 113 mil milhões de dólares em investimento directo em África, mais do que canalizaram ao longo de toda a década de 2012 a 2022 (102 mil milhões de dólares). O circuito funciona nos dois sentidos. Muitas empresas africanas, particularmente nigerianas, utilizam o Dubai como centro para alcançar mercados no Médio Oriente e Ásia.
Um acordo inovador no Gabão
Os bancos norte-americanos continuam a dominar a histórica área de emissões de dívida soberana. Em 2023, o Bank of America, em colaboração com a Corporação Financeira Internacional dos EUA, liderou um swap de 500 milhões de dólares de dívida do Gabão. Duas semanas após a conclusão do acordo, um golpe de Estado derrubou o Governo gabonês. Contudo, os títulos continuam a negociar-se bem.
Corredor do Lobito
Todos os olhares estão voltados para o Corredor do Lobito, um vasto projecto de infra-estruturas destinado a facilitar o transporte de minerais críticos entre Angola, Zâmbia e a República Democrática do Congo. Contudo, uma segunda administração Trump continuará a investir em África? O histórico de secundarização do continente, no primeiro mandato, não é animador.
O Presidente Joe Biden, que visitou Angola em Dezembro, apoiou pessoalmente o projecto, com Washington a investir mais de 4 mil milhões de dólares. Os bancos dos EUA estão profundamente envolvidos no financiamento.
“O próximo Governo continuará a encorajar esforços para construir parcerias sólidas com estados africanos e empresas locais, a fim de resistir à concorrência internacional”, diz uma fonte interna.
J. Peter Pham, antigo enviado de Trump para a região dos Grandes Lagos e Sahel, acredita que os EUA continuarão focados nos minerais africanos essenciais para a transição energética e tecnologias avançadas.
No entanto, questiona o estatuto da África do Sul no AGOA (Lei de Crescimento e Oportunidades Africanas), criticando a postura de Pretória, de condenação de Israel pela catástrofe humanitária em Gaza.
Porque importa? Porque a África do Sul é a principal porta de entrada dos bancos americanos em África.
Texto: Alberto Rodrigues • Fotografia: D.R.