A União Pan-Africana de Advogados (PALU) submeteu uma comunicação formal à Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, denunciando alegadas violações de direitos humanos e irregularidades nas eleições gerais de 2024 em Moçambique.
Durante uma conferência de imprensa virtual acompanhada pelo Diário Económico esta terça-feira (14), a organização revelou ter solicitado à União Africana (UA) e à Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) que intervenham no caso e não reconheçam o novo Governo liderado por Daniel Chapo.
O director-executivo da PALU, Don Deya, explicou que o pedido foi apresentado com carácter de urgência, visando travar a posse do Presidente eleito. “Submetemos este caso à Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, em Banjul, Gâmbia, e solicitámos que o encaminhe com urgência ao Tribunal Africano dos Direitos Humanos e dos Povos, com sede em Arusha, Tanzânia”, declarou.
O responsável sublinhou ainda que a organização representa um vasto conjunto de activistas moçambicanos e coligações de observação eleitoral que recolheram provas documentando “múltiplas violações da lei eleitoral, da Constituição e dos direitos humanos.”
A PALU considera que a actual conjuntura política no País exige medidas imediatas por parte das instituições africanas para evitar um agravamento da crise.
“Sabemos que os tribunais internacionais não operam de forma rápida, mas há mecanismos para a adopção de medidas provisórias e urgentes”, destacou Don Deya, acrescentando que o não reconhecimento de um Governo pela União Africana “tem implicações directas na sua legitimidade e funcionamento.”

A organização revelou também que solicitou à Comissão Africana que comunique o caso às mais altas instâncias da União Africana, nomeadamente ao presidente da Assembleia de Chefes de Estado e de Governo, ao Conselho de Paz e Segurança e ao Conselho Executivo. Além disso, a PALU apelou à SADC para que “se envolva activamente com os actores políticos moçambicanos e com a sociedade civil, garantindo um futuro democrático e estável para o País.”
Durante a conferência de imprensa, Don Deya alertou para os riscos de impunidade face às denúncias de repressão contra manifestantes e activistas. “Num contexto onde as forças de segurança e a polícia, por vezes, fazem parte do problema e não da solução, é fundamental que existam mecanismos internacionais de responsabilização”, afirmou.
A PALU defende que tanto a Comissão Africana como o Tribunal Africano podem ordenar investigações sobre os acontecimentos pós-eleitorais e responsabilizar os autores por eventuais abusos.
O director-executivo reforçou que este é um processo que poderá levar anos, mas que a PALU está preparada para uma luta prolongada. “Não há garantias de sucesso imediato, mas também não há garantias de insucesso. O que sabemos é que, se houver vontade política, são possíveis mudanças significativas, como demonstram os casos do Quénia e da Gâmbia”, referiu, citando intervenções anteriores da União Africana que resultaram em reformas constitucionais e transições políticas forçadas.
A tensão pós-eleitoral no País continua a crescer, com um novo anúncio de prolongamento das manifestações pacíficas por mais uma semana. O candidato da oposição, Venâncio Mondlane, convocou esta terça-feira a continuação dos protestos, que haviam sido convocados no sábado (11) e iniciados no dia 13, com previsão inicial de término a 15 de Janeiro. Segundo Mondlane, as manifestações irão manter-se activas em diferentes bairros e regiões do País.
“Estamos a lutar tanto contra a fraude eleitoral como contra a violência que marcou o processo eleitoral. Este pode ser o único espaço para trazer a verdade à luz e garantir que os responsáveis sejam responsabilizados”
União Pan-Africana de Advogados (PALU)
Desde o início da contestação aos resultados eleitorais, os protestos têm sido marcados por episódios de violência e repressão. De acordo com organizações da sociedade civil, pelo menos 613 pessoas foram baleadas e 4220 detidas, incluindo duas na segunda-feira (12), na cidade de Maputo.
A contestação aumentou após o Conselho Constitucional validar a vitória de Daniel Chapo, que conquistou 65,17% dos votos, enquanto Venâncio Mondlane obteve 24,19%. A cerimónia de investidura de Chapo está agendada para esta quarta-feira (15), num ambiente de forte contestação social e política.
A PALU alerta que este cenário de repressão agrava ainda mais a necessidade de intervenção da União Africana e de outras entidades internacionais. “Estamos a lutar tanto contra a fraude eleitoral como contra a violência que marcou o processo eleitoral. Este pode ser o único espaço para trazer a verdade à luz e garantir que os responsáveis sejam responsabilizados”, afirmou Don Deya.
A União Pan-Africana de Advogados (PALU) é uma organização continental que reúne associações de advogados, sociedades jurídicas e profissionais de direito de toda a África. Sediada em Arusha, na Tanzânia, a PALU tem como missão promover o Estado de Direito, a democracia e os direitos humanos no continente, intervindo em casos de relevância internacional junto do Tribunal Africano dos Direitos Humanos e dos Povos e da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.
Texto: Felisberto Ruco