Moçambique vive momentos tensos desde Outubro, devido às manifestações violentas que acontecem em quase todas as províncias, com mais incidência na cidade e província de Maputo. O cenário já obrigou à suspensão de várias empresas e colocou milhares de moçambicanos no desemprego, causando também prejuízos avultados.
Desde o início dos protestos, infra-estruturas públicas foram vandalizadas, fronteiras encerradas, corredores comerciais paralisados, estabelecimentos comerciais saqueados e algumas agências bancárias foram também destruídas, o que, a longo prazo, poderá levar ao encarecimento do custo de vida, à escassez de produtos básicos nos mercados e ao difícil acesso aos serviços mínimos.
Tal como o sector da hotelaria e turismo, a área das importações informais de produtos básicos também se queixa de perdas significativas geradas pelas manifestações, que, segundo a Associação Moçambicana dos Pequenos Importadores Informais, se situam em mais de 237,2 milhões de meticais (3,7 milhões de dólares, 70 milhões de rands).
Em entrevista exclusiva ao Diário Económico, Sudecar Novela, presidente do órgão dos mukheristas (importadores informais de produtos básicos a partir da África do Sul), afirmou que o encerramento das fronteiras, sobretudo a de Ressano Garcia, na província de Maputo (que liga Moçambique à África do Sul), tornou difícil a entrada de mercadorias no País para abastecer os mercados.
“Não conseguimos trazer as mercadorias segundo o planeado. Apesar de anunciadas atempadamente, as manifestações, em alguns pontos, aconteciam fora do previsto, o que afectava o nosso trabalho, pois os camiões ficavam retidos na África do Sul. A violência era uma realidade em Ressano Gracia e a circulação estava limitada, portanto, houve um impacto negativo para o nosso sector”, descreveu.
Novela clarificou que, no período do pico dos protestos, a mercadoria ficava retida por muitos dias, acabando por deteriorar-se, o que contribuiu para o aumento de perdas. “Estimamos perdas em mais de 70 milhões de rands, houve muita mercadoria que se estragou e foi directamente para a lixeira”.
Disponibilidade de produtos face à recente paralisação dos protestos
Actualmente, as manifestações estão paralisadas desde o dia 30 de Dezembro, o que propiciou o reinício das actividades, sobretudo do comércio formal e informal. Neste sentido, o responsável frisou que esta trégua ajudou a abastecer o principal mercado grossista de Maputo (mercado do Zimpeto), sendo que estão a trabalhar para recuperar dos prejuízos.
“Conseguimos abastecer o mercado e, com esta trégua, estamos a trabalhar para recuperar dos prejuízos. Até agora temos produtos no mercado grossista de Zimpeto, este que é o nosso centro de abastecimento. Dispomos de cebolas, batatas, repolhos, cenouras e outros produtos”, sustentou.
Sudecar Novela avançou que, apesar dificuldades, os preços dos produtos continuam estáveis, “10 quilogramas de cebola custam entre 200 e 250 meticais, e a mesma quantidade de batata custa entre 300 e 450 meticais.” No entanto, alertou para a grande possibilidade de “os preços poderem aumentar nos próximos dias, visto estarmos perante uma situação de agitação.”
Alerta para possível escassez dos produtos básicos
Durante a conversa com o DE, o presidente da entidade importadora alertou para uma possível escassez de produtos nos mercados a longo prazo, caso a situação de instabilidade persista, o que poderá originar uma crise alimentar, visto que o País é dependente da importações de alimentos, principalmente vindos da África do Sul.
“Estamos num momento imprevisível, em que as manifestações podem acontecer a qualquer hora. Com as agitações, os camiões com mantimentos importados não chegam a tempo, e o preço na fonte de aquisição também pode ser alterado”, argumentou.
“Poderemos ter problemas sérios de alimentação. Quando há manifestações, fecham as vias e isso é algo que não combina com o comércio. Caso o cenário se volte a repetir por sete dias ou mais, a situação alimentar vai ficar caótica, teremos pouca oferta para muita procura e os preços também vão disparar”, alertou.
Contudo, no que concerne aos saques que aconteceram na semana do Natal em vários estabelecimentos comerciais da cidade e província de Maputo, Novela garantiu que os seus associados não reportaram nenhuma perda.
“Não fomos vítimas de saques, pois, logo que a situação começou, demos ordem para encerrar o mercado do Zimpeto. As mercadorias estavam bem cobertas e o pouco que estava exposto foi vendido imediatamente”, justificou.
O País tem sido palco de manifestações organizadas por apoiantes do candidato da oposição, Venâncio Mondlane, que contestam os resultados divulgados pelo Conselho Constitucional. Organizações da sociedade civil referem que os confrontos entre manifestantes e as forças de segurança já resultaram em quase 300 mortos e cerca de 600 feridos.
O anúncio provocou novo caos em todo o País, com manifestantes pró-Venâncio Mondlane – que obteve apenas 24% dos votos – nas ruas, colocando barricadas, promovendo pilhagens e confrontos com a polícia, que tem vindo a realizar disparos para tentar repor a ordem
Texto: Cleusia Chirindza