Muito se tem discutido sobre o Conteúdo Local na cadeia de valor da exploração de gás, enquanto a indústria mineira (carvão, grafite, ouro e pedras preciosas) permanece menos analisada. Afinal, que desafios enfrenta e como pode ser mais bem aproveitada?
Em Moçambique, o progresso do Conteúdo Local no sector extractivo enfrenta desafios complexos, apesar do seu contributo potencial para o crescimento económico. Enquanto o gás natural tem atraído significativa atenção e investimentos, outras áreas da indústria extractiva, como a mineração, têm sido relegadas para segundo plano. As dificuldades incluem a frágil capacidade produtiva local, a escassez de profissionais qualificados e a inexistência de políticas específicas que estimulem a inclusão de empresas e fornecedores moçambicanos na cadeia de valor. Estas lacunas limitam as oportunidades de emprego e o crescimento da economia local.
Falta de Recursos e Infra-estruturas
A E&M ouviu o presidente da Câmara de Minas de Moçambique (CMM), Geert Klock, que contextualizou os desafios do sector mineiro. “Em primeiro lugar, a indústria mineira em Moçambique é jovem, com menos de 20 anos, e está ainda em crescimento. Progressivamente, está a substituir importações por compras locais, à medida que estas se tornam disponíveis”, afirmou. “É importante notar que muitas empresas mineiras estão em áreas rurais, onde a actividade comercial ou industrial é praticamente inexistente e faltam recursos básicos, incluindo capacidade técnica, para operar minas de grande escala”, acrescentou Geert Klock, sublinhando o grande potencial por explorar.
Para agravar a situação, segundo o mesmo, a actividade empresarial no país é maioritariamente informal, comprometendo a competitividade do sector privado. “Muitas Pequenas e Médias Empresas (PME) precisam de se formalizar para integrarem a cadeia de valor das multinacionais mineiras. A maioria das empresas com experiência em transações com este sector faz operações informais, sem registo, sem pagamento de impostos nem emissão de facturas, o que dificulta o acesso ao mercado mineiro”, explicou.
Dificuldades de Acesso ao Crédito
Outro obstáculo amplamente reconhecido é o custo elevado do crédito no País, que impede muitas PME de fornecer produtos e serviços adequados às multinacionais. “É comum que estas empresas não tenham stock do que vendem. Apenas após receberem a encomenda e o pagamento é que buscam o produto fora do País, comprometendo os prazos e a competitividade. Além disso, o custo elevado de empréstimos internos limita gravemente a capacidade de investimento e expansão”, lamentou Geert Klock.
Perspectiva das Mineradoras
A E&M também recolheu testemunhos de mineradoras sobre a sua experiência com fornecedores locais. No caso da canadiana Fura Gems, que explora rubis em Montepuez, Cabo Delgado, cerca de 75% das aquisições são feitas localmente. “Apenas importamos peças sobresselentes e componentes indisponíveis no mercado interno. Temos cerca de 600 trabalhadores e, contando com empreiteiros, atingimos os mil”, afirmou Chandra Shekhar Singh, representante da empresa.
Singh reconheceu, contudo, que é necessário contratar profissionais estrangeiros devido à falta de especialistas locais. “Gostaríamos de recrutar mais moçambicanos qualificados, mas não encontramos, o que nos obriga a trazer mão-de-obra da África do Sul, Zimbabué e Índia. É uma solução dispendiosa, mas inevitável. Para mitigar esta situação, assinámos recentemente um acordo com um instituto de formação, prevendo um investimento de um milhão de dólares nos próximos cinco anos”, explicou.
Por outro lado, a Montepuez Ruby Mining, que também opera em Cabo Delgado, tem cerca de mil empresas nacionais registadas na sua base de dados. “As PME locais representam cerca de 30% do nosso caderno de encargos, fornecendo materiais industriais, construção civil, equipamento de protecção individual, componentes electrónicos e de TI, além de serviços de manutenção e segurança”, revelou a empresa.
Sobre os planos futuros, a Montepuez Ruby Mining garantiu: “Manteremos o nosso compromisso de incluir fornecedores nacionais. Pretendemos aumentar a contratação de trabalhadores locais em cerca de 300 para apoiar a expansão da planta de processamento, que triplicará a capacidade actual de 200 para 600 toneladas por hora”.
Uma Iniciativa Promissora
Geert Klock destacou soluções diferenciadas para desafios distintos. “A indústria mineira em Moçambique abrange desde grandes empresas, como a Vulcan e a Kenmare, até mineradoras de menor escala. Em Cabo Delgado, a iniciativa MozaUp oferece formações sobre gestão financeira, procurement, enquadramento fiscal e conformidade legal, ajudando as PME a tornarem-se fornecedores mais competitivos”, referiu Klock.
Texto: Nário Sixpene • Fotografia: D.R