Moçambique vive um clima de instabilidade devido às manifestações gerais convocadas pelo candidato presidencial do Partido Optimista pelo Desenvolvimento de Moçambique (Podemos), Venâncio Mondlane, que reivindica a vitória das eleições presidenciais de 9 de Outubro, das quais, segundo os resultados apresentados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), quem saiu vitorioso foi Daniel Chapo e a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder desde a Independência.
Os protestos começaram a 21 de Outubro em todo o País. Mas o que era para ser inicialmente pacífico, tomou outros contornos, causando a morte de mais de 50 pessoas, feridos graves e ligeiros, bem como a vandalização de infra-estruturas públicas e privadas, violência extrema por parte da polícia e dos cidadãos moçambicanos, obrigando ao encerramento e à paralisação dos serviços.
Ambiente quase idêntico foi vivido na província de Maputo, onde um grupo de residentes decidiu fechar totalmente a estrada que dá acesso ao Parque Industrial de Beleluane, onde está situada a Mozal, empresa produtora de alumínio responsável por parte significativa do total das exportações de Moçambique.
Estes actos levaram também o Governo sul-africano a encerrar temporariamente a fronteira do Lebombo, que liga os dois países. A direcção da fábrica Safira Mozambique Cerâmica também decidiu suspender as suas actividades na sequência de uma greve violenta dos trabalhadores associada às manifestações gerais.
Diante destes acontecimentos, o Diário Económico procurou um especialista para perceber os impactos que estas acções podem trazer para a economia, e consequentemente para o desenvolvimento do País. Nas linhas seguintes, conheça, com detalhe, os riscos destas manifestações, que tendem a deixar o ambiente de negócios fragilizado e com perigo de perder alguns potenciais investimentos.
Redução das importações e exportações, aumento da inflação
Na sua explanação, Moisés Albino Nhanombe, economista e docente da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), começou por descrever que, antes das eleições e manifestações, o País estava num processo de recuperação dos desafios impostos pela covid-19 e já vinha demonstrando sinais positivos. No entanto, ainda estava convalescente e o facto de a economia nacional ser dependente de recursos naturais primários torna-a vulnerável, ou seja, qualquer flutuação do preço internacional pode afectar o seu crescimento.
Neste sentido, o economista afirmou que os processos de encerramento de fronteiras vão ter impactos profundos e negativos, afectando diversos sectores a vários níveis, explicando que a economia nacional vai ressentir-se desse fecho e a produção pode ser descontinuada, pois haverá uma inviabilização do fluxo normal de pessoas e bens, impactando no processo de importação e exportação.
“Moçambique depende das receitas provenientes das exportações de recursos naturais e da importação de bens de consumo e de capital. Assim, este encerramento vai criar desequilíbrios comerciais. Podemos encontrar o problema da interrupção das cadeias de suprimentos, pois muitas dependem das rotas internacionais. Existe o risco de escassez de produtos e matérias-primas, levando ao aumento da inflação e encerramento de empresas”, destacou.
Redução das receitas no sector do turismo e desemprego
O sector do turismo é importante para a economia do País, contribuindo de maneira significativa para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). De acordo com dados do Governo, mais de 40% dos projectos de investimento registados no País em 2023 foram direccionados para o sector do turismo, rendendo 7,3 mil milhões de dólares.
Por isso, Nhanombe foi mais profundo nas suas análises, ao declarar que a insegurança política vai forçar a redução das receitas no sector do turismo, pois as pessoas serão obrigadas a cancelar as suas reservas, principalmente nesta quadra festiva, em que havia muita expectativa por parte dos operadores.
“Este fecho pode resultar em perdas significativas e, de forma paralela, aumentar o desemprego e a pobreza. Se temos empresas encerradas, principalmente as Pequenas e Médias Empresas (PME) que são pouco resilientes, essa questão pode levar à demissão em massa das pessoas”, sustentou.
“O sector informal em Moçambique é muito alto e com o desemprego haverá muita mão-de-obra activa que poderá também entrar para o informal, o que terá implicações, como a redução da receita fiscal e do pagamento de impostos, ou seja, vai diminuir a capacidade do Governo em financiar os programas sociais e de investir em sectores sociais importantes”, frisou.
Invasão das multinacionais versus a perda da confiança dos investidores
O entrevistado considerou que as multinacionais são um sector sensível neste processo das manifestações, pois a invasão às instalações pode acarretar consequências económicas grandes, que podem afectar a confiança dos investidores internacionais gerando uma instabilidade que vai causar alguma perda de confiança.
Para Moisés Nhanombe, “quando as multinacionais são afectadas, reduz-se a confiança, o que pode levar à fuga de capitais, na medida em que, ao serem atacadas, elas podem considerar cancelar os investimentos, e se perceberem que os riscos são elevados podem deslocar recursos para outros mercados que sejam seguros”.
“Este caos vai criar uma imagem negativa do País como destino de negócio, prejudicar a reputação global e dificultar novos acordos de investimento, gerando demissões em grande escala. Há empresas fornecedoras de serviços que vão perder o acesso de fornecer, haverá perda das receitas do Governo, o que dificultará o financiamento aos serviços básicos e aprofundará, cada vez mais, os problemas socioeconómicos”, disse.
Implicações para o PIB
Nos documentos de suporte ao Plano Económico e Social do Orçamento do Estado (PESOE) para 2024, o Governo apontava para um crescimento do Investimento Directo Estrangeiro (IDE) para 4,7 mil milhões de dólares, ajudando o PIB a crescer 5,5% este ano, em previsões feitas antes de Outubro, e não considerando, portanto, o impacto económico de paralisações e tumultos que se seguiram à divulgação dos resultados eleitorais.
O mesmo pensamento foi partilhado pelo economista e docente da UEM, ao afirmar que “a fraca exportação levará à queda do crescimento económico e haverá diminuição de divisas, causando um impacto negativo para o PIB.”
“As multinacionais, sobretudo em Moçambique, são os sectores que mais contribuem para o PIB. Estamos a falar da mineração, energia e agro-indústria. Portanto, qualquer interrupção nas suas operações vai reduzir ou impactar fortemente aquilo que é a produção nacional e, por consequência, aquilo que é o crescimento económico”, argumentou.
“Com uma menor entrada de divisas, pode haver uma maior desvalorização da moeda nacional, um aumento da inflação e a a criação de uma certa pressão sobre o próprio custo de vida. Haverá também redução da receita fiscal”, descreveu.
Medidas de contenção para evitar mais perdas
Entretanto, para evitar mais danos, o especialista defendeu que o Governo deve tomar medidas imediatas para restaurar a confiança dos investidores e fortalecer as relações com as empresas e com as comunidades locais. Por isso, deve promover acções coordenadas que vão viabilizar o diálogo, para que se restaure a segurança, de modo a ter um ambiente de negócio inclusivo e previsível para que as empresas se sintam seguras.
“Há que estancar a onda de instabilidade para o bem-estar social do País. É preciso que o Governo garanta a segurança e que haja respeito com os contratos assinados. Deve haver diálogo com os investidores e empresários para compreender os seus sentimentos, evitando que mais empresas fechem”, frisou.
“Apesar dos desafios, Moçambique continua com potencial económico, sobretudo nos sectores da energia e agricultura, mas é preciso que esse potencial seja transformado numa prosperidade para o consumo da população e são necessárias políticas públicas eficazes que garantam estabilidade e compromisso sólido”, concluiu.
Texto: Cleusia Chirindza