Em Agosto de 2023, o cenário económico mundial observou um novo momento, marcado por algumas alterações no seu panorama, tudo porque os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) decidiram expandir-se, admitindo novos países. Na reunião que aconteceu na cidade sul-africana de Joanesburgo, os membros plenos da cúpula concordaram em admitir para o seu grupo a Arábia Saudita, Egipto, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irão.
Com esta abertura, e aliada ao nível de proximidade de Moçambique com alguns Estados-membros, surgiram “vozes” que afirmaram que o País se preparava para aderir ao bloco económico “afrontando” o Ocidente (União Europeia e Estados Unidos da América). No entanto, até agora, nenhum convite formal foi endereçado a Moçambique (recorde-se que o conjunto esteve reunido recentemente, entre 22 e 24 de Outubro, na cidade russa de Kazan).
O Diário Económico contactou alguns analistas para, juntos, fazerem uma reflexão sobre as possibilidades de um eventual convite a Moçambique para aderir à cúpula dos BRICS. Nas linhas que se seguem, conheça os riscos e benefícios que este bloco económico pode oferecer ao País, que se encontra em franco desenvolvimento, sendo detentor das maiores reservas de gás natural do mundo.
Facilidade de acesso ao crédito para investimento
Moçambique debate-se com sérios problemas de acesso ao financiamento, o que tem condicionado alguns investimentos. Neste sentido, o economista sénior do International Growth Center (IGC) da London School of Economics (LSE), Egas Daniel, afirmou que, ao aliar-se aos BRICS, o País beneficiaria de algumas facilidades, atraindo mais investidores para várias áreas.
Egas Daniel entende que a adesão aos BRICS pode atrair um certo grau de cooperação comercial mais estreita, recordando que as economias que estão em ascensão significativa também são membros, com destaque para a China.
“Não se pode esquecer que a China é o maior parceiro económico do continente africano e o Brasil é também um dos maiores parceiros de Moçambique. Os demais países dos BRICS fazem parte da nossa matriz de credores na nossa dívida externa. Há muitos benefícios sob o ponto de vista de investimentos, nomeadamente uma menor burocracia para ter acesso aos créditos, que é muito menor comparativamente com a da União Europeia e do Banco Mundial”, explicou.
O economista disse ainda que um dos benefícios para Moçambique ao aliar-se aos BRICS é a facilidade para exportação do gás natural e carvão, porque todos os países do bloco são grandes consumidores daquelas fontes energéticas.
Carteira de investimento clara e objectiva para evitar corrupção
Egas Daniel alertou que um país que entra para os BRICS deve ter uma carteira de investimentos clara, especificando o tipo de recurso de que precisa e o tipo de relações que pretende estreitar. “Por exemplo, em caso de fluxo de créditos para Moçambique, é preciso que sejam conhecidas as áreas de investimento para a aplicação destes créditos”, sublinhou.
“O rigor no acesso ao fluxo de capitais para o investimento é menor nos BRICS, e se houver indisciplina no uso destes recursos é provável que Moçambique não tenha muitos ganhos porque a elite política pode apropriar-se indevidamente dos mesmos”, sustentou.
O entrevistado argumentou ser necessário “afinar a máquina” e assegurar que os interesses particulares para Moçambique sejam salvaguardados, afirmando que “uma definição clara das propriedades de desenvolvimento em infra-estruturas, e não só, é preponderante para que o País maximize os ganhos.”
Os perigos económicos e a política dos não-alinhados
Para aprofundar ainda mais o assunto, o Diário Económico contactou também um analista de relações internacionais, que trouxe uma abordagem mista do assunto, fazendo um cruzamento entre a política e a economia.
Wilker Dias explicou que, na sua opinião, não é prudente que Moçambique faça parte dos BRICS, pois o acto colocaria em causa a estabilidade do próprio País, visto que se vive num momento de muita instabilidade relacionada com as eleições gerais e o conflito em Cabo Delgado, acrescentando que não se pode esquecer que Moçambique se revê nas políticas dos “não-alinhados”.
“Moçambique não pode aderir aos BRICS devido à política dos não-alinhados. O País não se revê nem com o Ocidente, nem com o Oriente. Os BRICS são movidos por questões ideológicas e não apenas por questões económicas”, justificou.
Dias frisou que “ao aderir à cúpula, o País estaria a quebrar a base da política-externa e isso pode trazer consequências graves.” “A ideia é que Moçambique deve manter amizade com todos os países ao nível do mundo, principalmente neste momento de guerras na Ucrânia e em Israel. Estas são guerras movidas a blocos económicos internacionais”, elucidou.
Neutralidade e garantia de maiores parcerias internacionais
Na sua explanação, o analista descreveu ainda que o mundo está dividido em blocos e que cada um tem as suas ideologias. “A Rússia tem as suas ideologias e o Ocidente também. Seria perigoso para Moçambique aderir aos BRICS porque, se precisar de preservar os dois lados e pautar-se pela neutralidade, o melhor mecanismo é garantir um maior número de parceiros internacionais.”
O entrevistado argumentou que o Ocidente é um dos principais financiadores de Moçambique no pacote de desenvolvimento social, ao contrário da China e outros países dos BRICS.
Segundo Dias, o crescimento e expansão do bloco deve-se ao facto de este apresentar uma perspectiva futurista, o que influencia em grande medida que os seus aliados registem um desenvolvimento económico.
“Os benefícios para Moçambique ao aderir aos BRICS estão relacionados com o domínio da industrialização com os diferentes países. Por exemplo, a relação bilateral entre a Rússia e o Brasil tem sido benéfica para ambos. O mesmo cenário se verifica na cooperação Rússia e Índia, que influenciou a implantação de uma fábrica de blindados naquele país asiático”, concluiu.
“Saudamos o facto de privilegiarem a componente de financiamento em infra-estruturas económicas e sociais, sendo de destacar a necessidade concreta de construção de estradas, pontes, escolas, hospitais, barragens e outros sistemas de retenção e gestão da água”, disse o estadista, durante a sua intervenção como convidado na 15.ª cimeira, que teve lugar na África do Sul.
No que diz respeito ao Novo Banco de Desenvolvimento dos BRICS, o chefe do Estado destacou, na altura, que o mesmo vai servir para reduzir o défice de infra-estruturas no continente africano, estas que “são importantes para impulsionar o progresso económico e criar bem-estar para os moçambicanos.”
Texto: Cleusia Chirindza