Ao encarar a logística como um pilar, os desafios do sector ganham outra preponderância, assinala Fanile Shongwe, Director da Banca de Investimento do Standard Bank Moçambique.
Fanile Shongwe, Director da Banca de Investimento do Standard Bank Moçambique, destaca o sector logístico como um pilar essencial para o desenvolvimento económico do país. Com uma costa extensa e ligações regionais estratégicas, Moçambique tem o potencial de ser um líder logístico na África Austral. No entanto, desafios como a manutenção de infra-estruturas e a necessidade de maior conectividade norte-sul persistem. Shongwe sublinha a importância da tecnologia para melhorar a eficiência e reduzir custos, e vê um futuro promissor, impulsionado por investimentos estrangeiros e parcerias regionais, que poderão transformar o País num centro logístico vital para a região.
Como é que o Standard Bank analisa o sector da logística e o seu reconhecido potencial para o desenvolvimento da economia nacional?
Moçambique é a nossa casa, e impulsionamos o seu crescimento há 130 anos. Somos o maior banco de África em termos de activos, com presença em 20 mercados. Estamos firmemente focados em sectores que impulsionam o crescimento económico nos países onde estamos presentes, incluindo Moçambique. A infra-estrutura (que inclui transporte e logística) é um dos nossos sectores-chave, e reconhecemos a sua importância na facilitação do comércio regional, na criação de emprego e, em última análise, no impulso ao crescimento económico. Temos relações estreitas com as principais partes interessadas no sector de transporte e logística e contribuímos para o crescimento e concretização do potencial do sector através da partilha do nosso conhecimento especializado, soluções bancárias e de consultoria. Por exemplo, estamos envolvidos no Corredor Logístico de Maputo (CLM) desde 2003, que contribuiu com mais de 2,086 mil milhões de dólares para o PIB de Moçambique na última década.
Como descreveria o estado actual da infra-estrutura logística no País, e quais são os principais pontos fortes e a precisarem de melhorias?
Moçambique é um país com 2500 Km de costa e 4500 Km de fronteiras terrestres. A infra-estrutura logística é desenvolvida transversalmente, de oeste para leste, ligando os clusters mineiros e agrícolas dentro de Moçambique e nos países vizinhos aos portos de saída. O País tem uma rede viária de 30 000 Km e 2500 Km de linha férrea, o que é crítico no apoio à integração regional do País, particularmente com a entrada em vigor da Área de Livre Comércio Continental Africana (AfCFTA). A principal força do sector logístico em Moçambique é a sua interconectividade regional. Consequentemente, os nossos portos principais são de entrada estratégica para o hinterland regional, tanto para fluxos de importação como de exportação. A principal fraqueza do sector logístico de Moçambique é a conectividade limitada no sentido norte-sul, faltando ligações que conectem os corredores paralelos leste-oeste entre si. Adicionalmente, a vasta extensão do País torna difícil a manutenção da rede rodoviária. Não obstante, estas fraquezas estão a ser abordadas através de projectos para a reabilitação das redes rodoviárias nacionais, maioritariamente financiados por DFI.
Olhando para os subsectores, há também desafios…
No Rodoviário o maior desafio tem sido encontrar um ponto de equilíbrio entre mobilizar recursos e financiamento para necessidades de manutenção da infra-estruturas existentes versus o investimento na expansão da rede. Para os caminhos-de-ferro, o desafio advém dos volumes crescentes movimentados ano após ano, impulsionados pelo aumento do comércio regional e global, o que coloca pressão sobre a capacidade existente e exige investimento constante na expansão. O principal desafio para os portos é garantir que permaneçam competitivos a nível regional, sendo mais eficientes, rentáveis e mais bem conectados, permitindo-lhes atrair mais tráfego para os seus terminais. O porto de Maputo, que é gerido pela MPDC, e está integrado no Corredor Logístico de Maputo, investiu mais de 800 milhões de dólares desde 2003 para modernizar e expandir a sua infra-estrutura. Como resultado, é bem visto e classificado pela sua eficiência na África Austral. Igualmente, o Porto da Beira atingiu a classificação mais elevada de todos os Terminais de Contentores da África Austral pelo Índice de Desempenho dos Terminais de Contentores do Banco Mundial, à frente de portos como o de Walvis Bay, Durban e Dar Es Salaam. Isto foi alcançado graças a um investimento significativo em equipamentos, infra-estruturas e sistemas. Em última análise, os portos e corredores são interdependentes. Os caminhos-de-ferro e as estradas são essencialmente as artérias que fornecem o sangue vital aos portos. Sem investimento, os portos não poderão operar ao seu potencial e vice-versa. Nota-se também um desafio nos postos fronteiriços, que pode ser um impedimento nos períodos de pico. No entanto, através do funcionamento ininterrupto e fronteiras de paragem única, o Governo tem vindo a trabalhar para reduzir o tempo em trânsito.
Os custos logísticos são competitivos em comparação com outros países da região? Quais os principais factores que influenciam esses custos?
Os principais factores que influenciam o custo da logística na região são a distância (que impacta o consumo de combustível, desgaste e manutenção) e o estado da infra-estrutura entre dois pontos. Moçambique é extremamente competitivo em comparação com outros países do bloco regional da SADC, devido às distâncias mais curtas desde a origem da carga até ao seu destino. Ou seja, Moçambique é a rota mais rápida e barata para os mercados internacionais de transporte marítimo para a Zâmbia, Zimbabué, Maláui e uma grande parte do sudeste da República Democrática do Congo.
Como é que a tecnologia está a ser utilizada para superar os desafios logísticos?
A tecnologia é utilizada para aumentar a eficiência e produtividade, simplificar processos, aumentar a segurança, reduzir custos, eliminar fraudes e reduzir a probabilidade de erro humano. A automatização e digitalização dos processos é uma ferramenta crítica no arsenal das empresas que operam no sector logístico. A MPDC e os seus parceiros são um estudo de caso perfeito de como a tecnologia pode ser aplicada para superar desafios logísticos. Conseguiram integrar sistemas tecnológicos com entidades como a Alfândega e o Km4, o que contribuiu para a melhoria da eficiência, reduzindo os tempos de espera de 24 para 10 horas. Tradicionalmente, sistemas de gestão operacional totalmente digitais, o rastreio em tempo real de pessoas e carga, o uso de câmaras em pontes de pesagem para identificar camiões e sistemas de marcação de camiões nos portos melhoram a gestão do tráfego e eliminam o uso de processos baseados em papel. O movimento automatizado de carga dentro dos portos é também outra área onde a tecnologia está a ser utilizada para melhorar processos.
O que torna Moçambique atractivo para o investimento no sector logístico?
Moçambique é um hub estratégico para a África Austral, o que significa que os investidores podem facilmente obter acesso ao mercado do hinterland, devido à interconectividade regional e à infra-estrutura já existente. Existem também incentivos para atrair investidores estrangeiros, incluindo isenções fiscais, Zonas Económicas Especiais e um quadro regulamentar que simplificou o processo de investimento, tornando-o mais fácil para as empresas estrangeiras.
Como é que o País está a posicionar-se no contexto da integração regional e que oportunidades daí advêm?
Como membro da Zona de Comércio Livre da SADC, o País beneficia de políticas comuns, redução de tarifas e de barreiras comerciais com os seus pares. Moçambique subscreve ao Plano Indicativo de Desenvolvimento Regional da SADC e está a capitalizar a sua posição estratégica junto ao oceano Índico, investindo pesadamente em infra-estruturas que suportam a integração regional. As parcerias regionais entre países criam uma série de oportunidades de crescimento para as economias e negócios.
Falava dos corredores de desenvolvimento, como o de Nacala e de Maputo. Que papel desempenham na melhoria da logística no País?
Os corredores de desenvolvimento melhoram significativamente a logística de um país, ao melhorar as redes de transporte, a optimizar as rotas comerciais e a estimular a actividade económica. O impacto económico do CLM (Corredor Logístico de Maputo) é tangível e material, mas isto resultou de investimentos materiais e de uma estratégia deliberada para integrar o corredor através de caminhos-de-ferro, fronteiras e estradas. O CLM criou mais de 331 500 empregos e gerou 500 milhões de dólares em impostos na última década. A recente reabilitação do Porto de Nacala transformou-o num dos mais modernos da África Subsaariana e poderá beneficiar de um concessionário com forte especialização para elevar o Corredor de Nacala. Os avanços mais recentes nestes projectos incluem a extensão da concessão do Porto de Maputo até 2058, durante a qual a MPDC planeia investir 2 mil milhões de dólares para duplicar a capacidade de movimentação do porto, incluindo o aumento da capacidade operacional de 37mtpa para 54mtpa, o aumento da capacidade do terminal de contentores de 270 mil por ano para um milhão de contentores por ano, a expansão do Terminal de Carvão de Matola de 7,5mtpa para 18mtpa e do Terminal de Carga Geral de 9,2mtpa para 13,6mtpa. Os concessionários do Porto da Beira também se comprometeram a investir 290 milhões de dólares ao longo dos próximos 15 anos na expansão e modernização do porto, aumentando a capacidade de manuseamento de contentores de 300 mil para 700 mil contentores por ano, bem como aumentos na capacidade de carga geral, armazenamento, melhoramento dos pontos de acesso, entre outros.
Que políticas públicas ou regulamentações vê como essenciais para melhorar o ambiente logístico em Moçambique?
Como país em desenvolvimento, é importante para Moçambique aprender com o que os países desenvolvidos fizeram bem e internalizar as lições de precaução ensinadas pelos seus erros. Melhorar a facilidade de fazer negócios é um bom ponto de partida para melhorar o ambiente, e vejo a implementação do Pacote de Medidas de Aceleração Económica (PAE) como uma excelente iniciativa com várias medidas que impactam o sector logístico. A esse nível, a iniciativa 11 é chave porque visa melhorar a competitividade dos aeroportos e corredores logísticos, simplificando procedimentos destinados a aumentar a eficiência nas fronteiras. Há também incentivos para o transbordo nos principais portos e tarifas mais competitivas aplicadas nos principais portos, corredores logísticos e aeroportos. Estamos encorajados pelos passos dados pelo Governo de Moçambique e da África do Sul para tornar o CLM mais eficiente; o posto fronteiriço de Komatipoort/Ressano Garcia agora opera 24 horas, o que reduziu a congestão na fronteira. A CFM e a Transnet assinaram recentemente um acordo que permitirá que os comboios de ambos os países circulem sem interrupções, eliminando a necessidade de trocar de locomotiva na fronteira e os consequentes atrasos. Isto aliviará a pressão sobre as estradas e transferirá a carga para os caminhos-de-ferro. Apesar destes desenvolvimentos positivos, é necessário fazer mais para reduzir a burocracia no posto fronteiriço, a digitalização do processo aduaneiro, a implementação de um sistema de paragem única e a adopção do AfCFTA.
Que tendências vê a moldar o futuro da logística no País nos próximos anos?
Começo por falar da sustentabilidade na logística. A Agência Europeia do Ambiente prevê representar até 40% das emissões globais de dióxido de carbono até 2050, a menos que sejam tomadas medidas eficazes. Portanto, os intervenientes na indústria terão de tomar medidas concretas para reduzir o seu impacto ambiental, o que implica compensação de carbono, optimização das rotas de transporte e mudança para veículos eléctricos ou da estrada para o caminho-de-ferro. Dito isto, existem muitas outras razões pelas quais as empresas do sector devem implementar estratégias de logística verde, particularmente em Moçambique, dada a susceptibilidade do País a eventos climáticos que causam interrupções no sector, resultando em perdas de receita. Antecipamos que haverá um grande foco na resiliência climática, o que exigirá cooperação com o Governo nacional. A melhor forma de prever o futuro é criá-lo, e o Standard Bank está a trabalhar com as principais partes interessadas no sector para concretizar a visão de futuro do País para o sector. Nos próximos cinco a dez anos, espera-se que os projectos de GNL estejam operacionais e isso trará os seus próprios desafios logísticos, e o País deve estar preparado para absorver a demanda adicional criada por esses projectos e corresponder ao nível de serviço exigido por uma indústria tão sensível e crítica. A modernização, expansão da capacidade e a capacidade de fornecer serviços de valor acrescentado, além da logística como a conhecemos, agora serão temas chave.
Texto: M4D • Fotografia: Mariano Silva