Os investimentos em estradas dependem de ajuda externa. As parcerias público-privadas (PPP) não têm trazido resultados para o financiamento doméstico. Aparentemente, a escassez de infra-estruturas não tem fim à vista.
O testemunho de quem desenvolve actividades que dependem das estradas, no dia-a-dia, à escala nacional, é impressionante. “A infra-estrutura de estradas e pontes existente no País apresenta graves deficiências, que têm um enorme impacto nas operações”, disse à E&M a directora-geral da TL Logistics, Kiluva Taveira. Cada percurso demora muito mais que o esperado, há “um desgaste acelerado da frota, avarias que surgem a qualquer momento, há elevados custos de manutenção e, inclusive, problemas de segurança da carga transportada”, descreveu.
O que poderia ser feito para melhorar a situação e tornar o País competitivo? “Deveriam ser feitos investimentos na N1, nas estradas de acesso e em plataformas logísticas, ao longo da estrada, infra-estruturas com áreas de descanso para os motoristas e parqueamento para os camiões, assim como locais para fornecimento de alimentação, higiene, etc. Isto para além de melhorias nas condições de circulação, nomeadamente sinalização e segurança das vias”, completou.
Tudo isto está a ser feito, timidamente e de forma insuficiente face às necessidades do País, num cenário de défice financeiro crónico para realizar intervenções na rede de estradas.
Alta dependência externa
De acordo com o Programa Integrado do Sector de Estradas (PRISE 2023), para o financiamento das intervenções do programa de estradas foi aprovado um orçamento de 20 208 milhões de meticais, dos quais 7612 milhões internos (38%), provenientes das taxas cobradas aos utilizadores e do Orçamento do Estado, e 12 596 milhões de meticais de recursos externos (62%), provenientes das contribuições dos parceiros de cooperação, na forma de donativos e créditos concessionais.
Apesar da cobertura externa, as intervenções continuam muito aquém das necessidades. Dos pouco mais de 33 000 quilómetros de extensão da rede de estradas classificadas, em que cerca de 80% não está asfaltada, a previsão do Governo, que consta do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado (PESOE 2024), é de reabilitar, este ano, apenas 232 quilómetros de estradas nacionais e regionais. O mesmo documento prevê que sejam asfaltados apenas 72,5 quilómetros. Há ainda uma rubrica de manutenção periódica que inclui 235 quilómetros, entre outros pequenos aspectos. Um esforço que está longe de fazer a diferença rumo à mudança reivindicada pelo sector e pela população. Uma solução definida pelo Estado como estratégica para resolver o problema é a concessão de estradas a privados para uma gestão através de parcerias público-privadas (PPP). Mas as experiências já realizadas não têm surtido efeito.
Porque não resulta a privatização?
As concessões envolvem a transferência de responsabilidades de operação e manutenção de certas estradas para empresas privadas, em troca de tarifas cobradas aos utilizadores, geralmente em forma de portagens. Ângelo Macuácua, PCA do Fundo de Estradas – entidade responsável pela manutenção, reabilitação e expansão da rede rodoviária –, arrola os cinco principais motivos que dificultam a privatização das estradas em Moçambique.
1. Condições económicas desfavoráveis
A crise económica, na sequência das dívidas ocultas, que veio à tona em 2016, afectou a confiança dos investidores, reduzindo o interesse em novos projectos de infra-estruturas. Isso limitou a capacidade de o Governo atrair investimentos para novas concessões.
2. Riscos de investimento
O problema de segurança, especialmente em Cabo Delgado, além da instabilidade económica, aumentou a percepção de risco entre potenciais investidores privados, dificultando a obtenção de financiamento e a concretização de novas concessões.
3. Retorno do investimento
O baixo poder aquisitivo da população moçambicana e a resistência ao pagamento de portagens em algumas regiões têm sido obstáculos para garantir retornos suficientes, tornando o negócio menos atractivo para empresas privadas investirem em novas concessões.
4. Capacidade institucional e regulatória
Apesar dos esforços para melhorar a regulação e gestão de concessões, ainda há desafios significativos relacionados com a capacidade institucional do Fundo de Estradas e de outras entidades governamentais em monitorizar e regular eficazmente as concessões existentes.
A complexidade dos contratos de concessão e a falta de experiência nalgumas áreas têm sido barreiras para avançar com novas concessões.
5. Negociações complexas
As negociações para novas concessões têm sido longas e complexas, muitas vezes levando a atrasos na implementação. Diferenças entre os interesses do Governo e dos investidores, bem como a necessidade de proteger os interesses públicos, resultaram em negociações prolongadas que, em alguns casos, levaram ao abandono de projectos.
Texto: Celso Chambisso • Fotografia: D.R.