A “doença holandesa” é um termo económico que designa as consequências negativas que podem advir de um aumento do valor da moeda de uma nação. Está principalmente associada à descoberta ou exploração de um recurso natural valioso e às repercussões inesperadas que essa descoberta pode ter na economia do país. O termo foi cunhado pela revista The Economist em 1977, quando analisou uma crise que ocorreu nos Países Baixos após a descoberta de vastos depósitos de gás natural no Mar do Norte, em 1959. A riqueza recém-descoberta e as exportações maciças de gás natural provocaram uma valorização acentuada do florim – moeda holandesa até 2002, tornando as exportações de todos os seus produtos e serviços não petrolíferos menos competitivas no mercado internacional.
O fenómeno ocorre tipicamente na sequência de um aumento das exportações associadas a recursos naturais, o qual resulta numa entrada substancial de moeda estrangeira. Nesta situação, há uma tendência de valorização da moeda nacional, pois há uma maior procura pela moeda do país para realizar transacções comerciais. Embora a valorização possa, à primeira vista, parecer positiva, esta pode espoletar efeitos negativos sobre outros sectores da economia não relacionados com o sector em que tenha ocorrido o crescimento económico, sendo, geralmente, as indústrias de agricultura, produção e transformação as que mais tendem a sofrer.
Com a valorização da moeda nacional, os produtos não relacionados com a exploração dos recursos naturais tornam-se menos competitivos para compradores estrangeiros, traduzindo-se numa redução das exportações desses outros produtos, prejudicando sectores não directamente relacionados com os recursos em questão. Por outro lado, o fortalecimento da moeda nacional conduz a um maior poder de compra dos agentes económicos residentes a nível internacional, tornando assim mais competitivos os bens e serviços importados, e desmotivando ainda mais a produção local.
Estas tendências associadas à valorização cambial e à concentração de riqueza no sector dos recursos naturais podem levar a uma desindustrialização progressiva. Os investimentos noutros sectores da economia tendem a diminuir, uma vez que a atenção e os recursos se concentram na exploração e exportação dos respectivos recursos valiosos. Esta desindustrialização resulta numa dependência crescente do sector de recursos naturais, aumentando o risco da economia e a exposição mais acentuada a ciclos económicos.
Os países que dependem fortemente de um recurso, ou de um conjunto limitado de recursos naturais, encontram-se, assim, mais expostos à volatilidade económica devido às flutuações nos preços internacionais desse(s) recurso(s). Se o preço desse(s) recurso(s) no mercado global cair substancialmente, o país poderá entrar numa crise económica profunda, pois grande parte da sua receita, gerada a partir da exploração desse recurso, também reduz de forma significativa.
Além das implicações económicas, a exploração e dependência de recursos naturais pode ter efeitos sociais e políticos. A riqueza gerada e a sua concentração tendem a originar desigualdades económicas e sociais, aumentando o risco de corrupção e conflitos relativamente à distribuição dos recursos. A gestão dos recursos e a sua distribuição equitativa tornam-se questões cruciais para a estabilidade política e social do país.
Países como o Reino Unido, o Canadá e a Rússia sofreram os efeitos da doença holandesa devido à forte expansão e exploração dos seus recursos naturais. A experiência de vários países que já enfrentaram esta realidade levou ao desenvolvimento de medidas para mitigar os efeitos e riscos associados à doença holandesa, tais como: privilegiar a diversificação económica; adopção de um regime de câmbio flexível; políticas fiscais focadas no controlo da inflação; investimento em serviços públicos; encorajamento da poupança e investimentos e promoção da educação para os residentes; criação de fundos soberanos, entre outros. A implementação destas estratégias pode ajudar os países a gerir os desafios associados à doença holandesa e promover um desenvolvimento sustentável.
Em Moçambique, com a descoberta e a exploração dos megaprojectos de gás natural na região de Cabo Delgado, embora o País se encontre também exposto aos riscos da doença holandesa, existem mitigantes. Em particular, deve destacar-se que os accionistas destes projectos são, na sua maioria, multinacionais, e as receitas previstas para a exploração do gás serão, em grande medida, e numa primeira instância, utilizadas para o pagamento do financiamento do projecto, não entrando assim, de forma directa, na economia moçambicana. Por outro lado, as receitas que serão alocadas ao país nos primeiros anos, sobretudo na forma de royalties, serão canalizadas em parte para o Orçamento do Estado, cabendo ao Governo a responsabilidade de decidir a sua alocação, e a outra parte para o Fundo Soberano, criado recentemente e em específico para lidar com alguns dos riscos da doença holandesa, tendo como objectivo preservar riqueza para as gerações futuras.