Na primeira round table do I Fórum Banca E&M-PwC, realizado na quinta-feira, 18 de Abril em Maputo, “ESG, Inclusão Financeira e a Transição Digital em Moçambique na Perspectiva dos Bancos Sistémicos” foi o tema que juntou, pela primeira vez, os PCE dos três maiores bancos no mercado interbancário moçambicano. Standard Bank, BCI e Millennium bim, representados ao mais alto nível, partilharam iniciativas, debateram estratégias e apresentaram planos de acção sobre a adopção de critérios de sustentabilidade (ESG), transição digital e inclusão financeira num debate que, de forma resumida, mostrou um alinhamento de perspectivas entre os três bancos sistémicos, embora com diferentes formas de abordar algumas das questões que se colocam, de forma global, ao sistema financeiro. Veja o vídeo completo da primeira round table no fim do artigo.
Adopção de ESG nas instituições bancárias
A adopção de critérios ambientais, sociais e de boa governação (ESG) pelos principais bancos nacionais assume hoje contornos decisivos e estratégicos para todo o sector. Bernardo Aparício, PCE do Standard Bank, começou, a este nível, por destacar a necessidade de uma “transição energética justa e equitativa” para todos, sublinhando o papel da instituição que lidera no apoio a “empresas que contribuem para o desenvolvimento de ecossistemas essenciais”, e lembrando projectos significativos em infra-estruturas e energia de transição que o Standard Bank tem financiado, “fruto do seu compromisso com o crescimento sustentável do continente africano”. Pode ver o vídeo integral do painel no final do artigo.
“Estamos conscientes da importância de equilibrar as questões ambientais com as sociais, para que o progresso num dado sector não prejudique o outro. Com presença em 20 países africanos, compreendemos que a transição para energias sustentáveis não deve impedir o desenvolvimento destas nações. O nosso compromisso é crescer com o continente, fomentando o progresso em África e melhorando a vida dos seus habitantes”, complementou, sem esquecer o “compromisso com projectos significativos de energia de transição, como o gás natural” do qual o banco, como se sabe, é um dos financiadores. Salientou ainda a continuação do apoio a projectos em países como Moçambique, Namíbia e Uganda, “promovendo uma transição energética adaptada às necessidades africanas”.
Já o PCE do BCI, Francisco Costa, enfatizou “a importância das iniciativas internas e externas” do banco para promover práticas sustentáveis, mencionando que, “internamente, focamo-nos nos nossos consumos e na racionalização das energias que utilizamos, nomeadamente na transição para energias renováveis”, e revelando que “já estão a ser implementados pilotos com energia solar em algumas agências, o que reflecte uma preocupação genuína e uma abordagem consciente destes temas”. Já para fora assumiu que devido à dimensão e impacto do banco na economia, há uma influência tendente à mudança, “que já exercemos sobre os nossos fornecedores. Adoptámos critérios de ESG no processo de procurement, demonstrando a integração destes valores nas nossas operações diárias”.
Falou também, enquanto banco com accionistas maioritários europeus (Caixa Geral de Depósitos e BPI), sobre o impacto das regulações europeias relativas às metas de ESG, nomeadamente na neutralidade de emissões de carbono desejável para atingir nas próximas décadas. Além disso, sublinhou a convicção de que “é possível alavancar a economia e o negócio adoptando práticas ESG, em vez de limitá-la, através da colaboração activa com clientes na integração dessas práticas”.
Por sua vez, João Martins, PCE do Millennium bim, enfatizou “a urgência de reconhecer e agir face às alterações climáticas”, salientando a importância de reformular os padrões de organização e consumo para assegurar a sustentabilidade, deixando bem clara a ambição do banco “em ser um agente de mudança, comprometido em adoptar práticas sustentáveis e contribuir activamente para a preservação do planeta”. E prosseguiu, enunciando algumas das medidas postas em prática pelo banco: “estamos a introduzir um novo conceito de balcão, semelhante ao que o BCI está a implementar, que incorpora o uso de painéis solares. A ideia é que cada balcão seja neutro em termos de emissões de carbono. Além disso, na nossa sede, estamos a investir significativamente na instalação de painéis solares em áreas amplas disponíveis, para reduzir substancialmente a nossa pegada de carbono”, explicou.

Lucro vs investimento verde? Não é por aí…
Há, nos últimos anos, uma questão que tem sido latente no sistema financeiro mundial e que se relaciona com os investimentos ‘verdes’, cada vez mais prioritários face aos projectos que provocam impacto ambiental – casos dos investimentos nas extractivas ou no oil & gas. Bernardo Aparício destacou, a este nível, “a responsabilidade da banca em promover a transição energética, essencial para alcançar objectivos de sustentabilidade. Alocar capital a projectos alinhados com o ESG é uma oportunidade de negócio, assim como uma responsabilidade,” afirmou.
Francisco Costa focou-se na sinergia entre rentabilidade e responsabilidade social. “Não vejo um conflito entre lucro e investimento verde, pelo contrário. Quanto mais rentável for a empresa, maior será a sua capacidade para contribuir socialmente,” enfatizou. E exemplificou o compromisso do banco com práticas sustentáveis, citando “a parceria com a Biofund e o lançamento de um cartão biodegradável, reflexos do nosso ADN de responsabilidade social.”
Pelo lado do Millennium bim, João Martins abordou a complexidade e a inevitabilidade da agenda ESG e quis deixar claro precisamente que ambas não são conflituantes, bem pelo contrário. “Estamos diante de uma mudança onerosa mas necessária, que vai requerer adaptação profunda na forma como todos operamos,” assinalou. E não deixou de expressar “o compromisso do banco em superar os desafios no desenvolvimento sustentável”, aludindo, uma vez mais, à necessidade de “equilibrar investimentos e práticas sustentáveis”, até porque, anuiu, “este não é um trade-off, não é assim que o vejo. É possível continuar a investir na economia e no seu crescimento, de forma cada vez mais sustentável e com menor impacto, e há cada vez mais ferramentas para isso no sector financeiro”.
Inovação digital “essencial” para promover a inclusão financeira
Outro dos grandes temas em debate foi, claro, a transição digital em curso, ponto em que os líderes dos três maiores bancos nacionais expuseram as estratégias adoptadas pelas suas instituições para capitalizar a era digital, expandir a oferta de serviços financeiros e, ponto comum a todos, aproximar e levar o maior número de serviços bancários, com o menor custo possível, ao maior número de Moçambicanos nos próximos anos. As discussões centraram-se em como a transformação digital está a abrir portas para um maior acesso aos serviços bancários, reflectindo um esforço conjunto para incorporar mais Moçambicanos no sistema financeiro formal.
Bernardo Aparício começou por enumerar os projectos do Standard Bank focados precisamente na digitalização e na inclusão financeira. “Estamos alinhados em incluir o maior número de Moçambicanos na economia formal e no sistema de pagamentos, e a custos cada vez menores. Existem vários projectos em desenvolvimento, como o novo sistema de pagamentos, as transferências em tempo real e a biometria, que começará em breve. São projectos que têm sido trabalhados em colaboração com todo o sector financeiro e com o regulador, e que continuarão a progredir nos próximos anos para facilitar e reduzir o custo da transaccionabilidade em Moçambique.”
Francisco Costa esclareceu que o BCI está envolvido “numa vertente interna de digitalização que incide sobre o impacto significativo no tratamento de dados, na construção de valor através da análise de dados e na diminuição de erros operacionais. Estas acções fortalecem o negócio bancário e têm um reflexo positivo nos clientes, aumentando a capacidade do banco de aprimorar o conhecimento sobre o cliente, a segmentação e a proximidade, o que torna o mercado mais eficiente e apto a responder às necessidades dos clientes.”
Já o Millennium bim, pela voz de João Martins, destacou que a estratégia digital “é fundamental” na operação do banco e que, já hoje, “todas as decisões são tomadas com o digital em mente, pois é através deste meio que a inclusão financeira é promovida. A estratégia digital do bim bifurca-se em duas vertentes principais, a externa e a interna. Na primeira, o banco tem investido fortemente nas suas aplicações móveis e outras soluções digitais, o que é evidenciado pelos números expressivos: mensalmente são realizadas mais de 20 milhões de transacções via mobile, com picos de até 30 milhões. A robustez dos sistemas é essencial para suportar esse volume de transacções e para oferecer o serviço que os clientes esperam e necessitam. Quanto à vertente interna, o bim está empenhado em digitalizar e automatizar processos para alcançar o nível de serviço que pretendemos. Sem essa evolução digital interna, o banco não teria a capacidade de expandir e servir um número crescente de clientes, que é o que se pretende”.

Cibersegurança: um desafio antigo com novas ameaças à espreita. IA já é presente e será parte do futuro
Bernardo Aparício começou por sublinhar “a necessidade de uma compreensão profunda dos riscos” cibernéticos por parte de todos os envolvidos, desde os colaboradores até aos clientes. “O conhecimento é o primeiro passo essencial na prevenção de ataques cibernéticos,” enfatizou, para depois assinalar o investimento em tecnologia de ponta e uma gestão criteriosa de acessos que constituem outro pilar na estratégia de defesa do banco que dirige. “Investimos continuamente em tecnologia avançada, equiparando-nos a padrões globais, para proteger as nossas infra-estruturas e canais,” detalhou.
Já Francisco Costa reforçou a importância de um plano robusto de continuidade de negócios. “Além dos investimentos em segurança, preparámo-nos para a eventualidade de ataques – e sabemos que eles são inevitáveis –, assegurando que o banco possa restaurar a normalidade operacional o mais rápido possível.”
Por sua vez, João Martins destacou o papel emergente da Inteligência Artificial (IA) na detecção e prevenção de fraudes. “A IA é um recurso valioso na nossa estratégia de segurança, melhorando não só a detecção de fraudes mas também a oferta de serviços,” comentou, não deixando de assinalar o facto de, uma vez mais, “este tipo de ataques estar cada vez mais disseminado”, tornando-se uma inevitabilidade.
Na última questão do debate, sobre a ascensão da Inteligência Artificial e a forma como esta pode ser usada pelo sector financeiro, os três coincidiram, assinalando haver mais dúvidas do que certezas quanto ao seu potencial que está agora, ainda, a começar a ser apreendido pela banca e por muitos outros sectores, mas a dúvida sobre como e quando ela entrará nas operações bancárias foi dissipada, e os três maiores bancos nacionais já a utilizam, do apoio ao cliente à análise de big data.
A primeira edição do Fórum Banca, uma iniciativa conjunta da Media4Development, publisher moçambicana detentora da revista Economia & Mercado e dos portais Diário Económico e 360º Mozambique, em parceria com a consultora PWC, teve como tema a “Banca e os Desafios do ESG e da Transição Digital em Moçambique”.
A primeira edição deste Fórum realizou-se num contexto em que os desafios emergentes de ESG (Ambiental, Social e Governance) e da transição e transformação digital são fulcrais para o Desenvolvimento Sustentável de Moçambique e reuniu, publicamente e pela primeira vez, os principais CEO de algumas das maiores instituições bancárias bancos nacionais – BCI, Standard Bank, Millennium bim, Access Bank, FNB e Nedbank, para além da Associação Moçambicana de Bancos.
Veja aqui o vídeo completo do primeiro painel: