Um grupo de investigadores da Universidade de Genebra, na Suíça, conseguiu transformar uma capacidade cognitiva humana em Inteligência Artificial (IA). Trata-se de realizar uma tarefa, sem treino prévio, com base em instruções verbais ou escritas, e depois descrevê-la a outros para que a possam reproduzir.
Os investigadores conseguiram modelar uma rede neuronal artificial capaz de realizar esta capacidade cognitiva humana. Estas redes neuronais são inspiradas nos nossos neurónios biológicos e na forma como estes transmitem sinais eléctricos entre si no cérebro.
A Inteligência Artificial é a capacidade de programas e dispositivos executarem tarefas através de algoritmos que simulam o raciocínio humano com base em padrões aprendidos. Depois de aprender e executar uma série de tarefas básicas, esta Inteligência Artificial foi capaz de fornecer uma descrição linguística das tarefas a outra IA, que por sua vez as executou.
Para o conseguir, os investigadores utilizaram um modelo de neurónios artificiais chamado S-Bert, que tem cerca de 300 milhões de neurónios e está pré-treinado para compreender a linguagem. Depois ligaram-no a outra rede mais simples de alguns milhares de neurónios.
De acordo com o site Tempo, na primeira fase, a rede neuronal teve de ser treinada para simular a área de Wernicke, localizada no hemisfério esquerdo do cérebro e associada à percepção e interpretação da linguagem. Na segunda fase, a rede foi treinada para reproduzir a área de “Broca”, também situada neste hemisfério, que ajuda na produção e articulação das palavras. Ambas as etapas foram realizadas em notebooks convencionais.
“Uma vez aprendidas estas tarefas, a rede foi capaz de as descrever para que uma segunda rede, uma cópia da primeira, as reproduzisse. Essa é a primeira vez que duas IA conseguem falar uma com a outra de uma forma puramente linguística” disse Alexandre Pouget, neurocientista e co-autor do estudo.
Em seguida, foram dadas instruções escritas em inglês à IA, tais como apontar para o local – à esquerda ou à direita – onde um estímulo é percepcionado; responder na direcção oposta a um estímulo; ou, algo mais complexo, entre dois estímulos visuais com uma ligeira diferença de contraste, destacar o mais brilhante. De seguida, os investigadores avaliaram os resultados do modelo, que simulava a intenção de se mover ou, neste caso, de apontar. Depois de aprendidas as tarefas, a rede foi capaz de as descrever para que uma segunda rede (uma cópia de si própria) as reproduzisse.
Segundo o estudo, os modelos de redes neuronais realizaram uma tarefa nunca antes vista com um desempenho médio de 83% de acerto com base apenas em instruções linguísticas.
Esta “conversa” entre IA é considerada promissora, especialmente para o domínio da robótica. “Actualmente, os agentes de conversação que utilizam IA são capazes de integrar informação linguística para produzir texto ou imagens. Mas ainda não conseguem traduzir uma instrução verbal ou escrita numa acção sensório-motora, e muito menos explicá-la a outra IA para que a reproduza”, afirmou Pouget.
Este modelo de IA abre novos horizontes para a compreensão da interacção entre a linguagem e o comportamento. E, segundo os investigadores, a rede desenvolvida é muito pequena, mas nada impede o desenvolvimento de redes muito mais complexas que seriam integradas em robots humanóides capazes de nos compreender a nós e aos outros.
Os resultados são promissores, sobretudo para a robótica, e foram recentemente publicados num artigo na revista Nature Neuroscience.