Desde a pandemia, os Estados Unidos da América e o Reino Unido eram os campeões do teletrabalho. Muitos empregados trabalhavam 100% do tempo à distância. Hoje, nestes países, “a bolha do teletrabalho rebentou”. Os gigantes de Wall Street e da tecnologia, que duvidam agora da produtividade desta modalidade, estão por detrás desta oscilação do pêndulo. Será que estamos a caminhar para um regresso em massa ao escritório? Aqui e ali, a resistência organiza-se.
Até há pouco tempo, as pessoas só defendiam o teletrabalho. A pandemia de covid-19 sensibilizou os escritórios, mostrando que de nada servia usar roupas elegantes abaixo da cintura, que não precisávamos de comprar o almoço, todos os dias, e que não fazia sentido passar várias horas por dia em engarrafamentos ou em comboios cheios e sempre atrasados.
Os trabalhadores de “colarinho branco” de todo o mundo foram assim libertos da tirania de passar a ferro e do café takeaway de cinco libras, o que lhes permitiu ter um melhor desempenho no trabalho. Dois estudos, realizados durante a pandemia, revelaram um aumento de 5% a 6% na produtividade dos trabalhadores das empresas norte-americanas, classificadas na Fortune 500. Isto foi bom para o negócio: empresas (como a Google, a Meta, a John Lewis e a Sainsbury’s) pouparam dinheiro ao fecharem os dispendiosos escritórios no centro das cidades, sem recearem uma quebra na produção e, consequentemente, nas receitas.
Mas, três anos depois, a bolha do teletrabalho rebentou. De acordo com os dados fornecidos pelo site de pesquisa de emprego Adzuna, 14% das ofertas de emprego anunciadas na Grã-Bretanha, em Janeiro de 2021, indicavam “teletrabalho a tempo inteiro”, face aos apenas 6% actualmente. Em contrapartida, o número de vagas de teletrabalho a tempo parcial aumentou, subindo de 2% para 19%, à medida que as empresas reduzem o número de empregados autorizados a trabalhar à distância a tempo integral.
Algumas, como a Goldman Sachs e a JPMorgan, estão a obrigar os empregados a regressar. Outras, como a Apple e a BlackRock, abandonaram o teletrabalho a 100% e exigem que os funcionários estejam no escritório, pelo menos três ou quatro dias por semana. A Zoom seguiu-lhes o exemplo e exige que os empregados regressem, pelo menos, dois dias por semana, se viverem num raio de 50 milhas [80 quilómetros]. É o cúmulo da ironia para uma empresa que se apoia no sucesso das aplicações de videoconferência. O declínio do teletrabalho reflectiu-se na queda espectacular da capitalização bolsista da Zoom, que passou de um pico de 160 mil milhões de dólares, em Outubro de 2020, para apenas 20 mil milhões. Outras empresas, que enriqueceram nos tempos em que trabalhar a partir de casa era moda, estão agora em apuros. O operador de espaços de coworking WeWork, que chegou a valer 47 mil milhões de dólares, anunciou recentemente que temia a falência, devido à queda da procura.
Na origem desta tendência está a percepção crescente, entre os patrões, de que o teletrabalho não aumenta a produtividade, nem sequer a mantém no nível original. Os estudos mais recentes refutam a ideia de que trabalhar a partir de casa torna o trabalhador mais produtivo. Um estudo realizado por economistas do MIT [Instituto de Tecnologia de Massachusetts] e da UCLA [Universidade da Califórnia, Los Angeles], relativo a operadores indianos recém-contratados, revela uma queda de 18% na produtividade dos teletrabalhadores, em comparação aos que trabalham no local. De acordo com outro estudo, os empregados de uma grande empresa asiática de tecnologia de informação eram 19% menos produtivos, quando trabalhavam a partir de casa. Os investigadores de Stanford analisaram uma série de inquéritos e encontraram uma queda média de produtividade entre 10% e 20%.
Alguns gestores e trabalhadores partilham da impressão de que o trabalho em equipa é muito mais difícil e menos eficaz, quando realizado à distância. Para Martin Sorrell, fundador da WPP, a maior rede de agências de publicidade e de relações públicas do mundo, existe um “cimento cultural” no local de trabalho, que se desintegra quando os empregados são pagos apenas para olhar para um ecrã a partir de casa. “No início, estávamos muito entusiasmados com o teletrabalho”, explica. “Acho que o nosso entusiasmo diminuiu um pouco desde então, e hoje temos uma posição moderada.” Jovens em desvantagem Elizabeth Sergeant, 31 anos, trabalha, três dias por semana, como executiva na ShipServ, uma plataforma online, especializada em equipamentos marítimos.
“Vi com os meus olhos quanto tempo demora um projecto quando as reuniões são virtuais”, explica. “Um projecto, que poderia ter sido concluído em três horas de trabalho de equipa, presencial, pode demorar várias semanas ou meses. É dez vezes mais difícil trabalhar em conjunto à distância do que presencialmente.” Há também quem considere que o teletrabalho põe os trabalhadores mais jovens numa posição de desvantagem, ao tornar, por exemplo, mais difícil a aprendizagem por meio da observação.
O nosso primeiro-ministro [Rishi Sunak] partilha claramente desta opinião: “Ainda falo com os tutores que tive, quando comecei a trabalhar”, dizia ao LinkedIn News, em Agosto de 2021. “Eles ajudaram-me ao longo da carreira, mesmo quando seguimos caminhos diferentes. Duvido de que tivesse conseguido criar laços tão fortes, se tivesse feito o meu estágio de verão ou dado os primeiros passos no mercado de trabalho no Teams e no Zoom.” Gareth Matthews, sócio da MLP Law, uma firma de advogados, em Manchester, concorda: “No nosso sector, em particular, é muito importante que os mais jovens vejam o que os mais velhos estão a fazer, que façam perguntas e sejam supervisionados em tempo real. As pessoas precisam de interacção e de feedback para se sentirem bem, o que é mais difícil de se conseguir quando essas interacções são apenas online.”
Os jovens não são os únicos a se sentirem isolados quando estão em teletrabalho. Num inquérito a mil adultos, encomendado pela [empresa ferroviária britânica] Great Western Railway, cerca de 80% das pessoas com mais de 55 anos afirmaram não gostar da forma como o trabalho a partir de casa esbate as fronteiras entre a vida profissional e a vida privada e 80% dos trabalhadores, com idades compreendidas entre os 45 e os 54, sentem-se sozinhos quando estão em teletrabalho. “As pessoas já não querem trabalhar a partir de casa”, afirma Mark Dixon, director-geral do operador de escritórios partilhados IWG. “Já estão fartas.”
Uma das consequências mais comuns do teletrabalho reside no saber quando se deve desligar. A notificação sonora de que chegou uma mensagem pode ser surpreendentemente irresistível, mesmo quando a resposta poderia facilmente esperar pelo dia seguinte. “Uma pessoa pode deixar as crianças na escola e ir buscá-las, sem que isso afecte o nosso dia de trabalho”, admite Gareth Matthews, pai de dois filhos, e não se distrai com o que se passa no escritório, quando precisa de se concentrar. “Porém, quando se trabalha em casa, pode ser mais difícil separar a vida privada da vida profissional, porque não há distância física ou temporal entre o trabalho e os compromissos familiares.”
Se algumas pessoas têm dificuldade em desligar-se do trabalho quando estão em casa, outras têm dificuldade em ligar-se a ele. Um inquérito, realizado a dois mil trabalhadores em regime de teletrabalho a tempo parcial pelo distribuidor de consumíveis para impressoras TonerGiant, revelou que estes passavam duas horas por dia, em média, a ver televisão. Um quarto estava com amigos ou família, durante o horário de trabalho, outro quarto havia feito bricolage ou jardinagem, e pouco menos de um quinto dormira a sesta. Um em cada oito teve relações sexuais e, surpreendentemente, um em cada dez teve mesmo um segundo emprego.
Então, será que trabalhar em casa está mesmo a funcionar? É essa a questão que se impõe.
Fonte: The Daily Telegraph • Autor: Tim Sigsworth