Até onde poderia crescer a economia se as PME, de repente, se tornassem eficientes na gestão de stocks, de pessoal, de combustíveis, emissão de facturas, cobranças e controlo de qualidade? Esta possibilidade já é real, graças à cada vez maior oferta de plataformas de Inteligência Artificial com diversas funcionalidades. Uma das mais recentes e ‘Made in Mozambique’ foi desenvolvida pela Jon Artificial Intelligence. O que tem para oferecer?
Nos últimos anos, a Inteligência Artificial (IA) tem sido usada para executar, de forma mais eficiente, tarefas que, de outro modo, seriam efectuadas manualmente: estabelecer ligações com os clientes, identificar padrões e resolver problemas.
Alimentada por várias formas de aprendizagem automática que reconhecem padrões nos dados para fazer previsões, a IA pode acrescentar valor às empresas em diferentes ramos ou sectores, proporcionando uma compreensão mais abrangente da abundância de dados disponíveis e baseando-se em previsões para automatizar tarefas demasiado complexas ou demoradas.
Estas características são uma grande oportunidade para vender soluções. Uma janela identificada por Stélio Inácio, jovem designer gráfico e informático que, em Maio de 2021, fundou a a Jon Artificial Intelligence, impulsionado pela necessidade de sacudir duas perguntas: “porque é que nós, africanos, ficamos sempre para trás em assuntos de tecnologia, conhecimento, criação e até utilização? Porque é que só esperamos receber de outros países?”. O empreendedor viu na disseminação de ferramentas de IA “uma oportunidade para dar contributos, produzindo sistemas ou aplicativos que possam mudar a visão dos africanos, não só em relação à IA, mas no ramo tecnológico no geral”.
Natural da cidade de Maputo, Stélio Inácio é um designer gráfico e informático que, em 2011, criou a sua primeira plataforma na web, chamada Agenda Mahala, uma rede social onde os utilizadores podiam adicionar eventos que iam decorrer nas suas cidades e que, com o tempo, passou a servir para acolher e divulgar aulas de inglês, para as quais Stélio Inácio escreveu os manuais.
“O software de facturação oferece a tecnologia “mensagem para cotação”, que permite criar orçamentos através de mensagens, usando linguagem natural…”
Em 2021, após dez anos de desenvolvimento e aperfeiçoamento da Agenda Mahala, decidiu abrir a Jon Artificial Intelligence, com o objectivo de utilizar a IA para fazer avançar a tecnologia. A 28 de Setembro, a empresa lançou o seu primeiro produto, designado Apps. Trata-se de um conjunto abrangente de ferramentas alimentadas por IA, como uma aplicação de facturação, uma plataforma de controlo de assiduidade, entre outros recursos. O produto começou a ser desenvolvido em 2021 e demorou um ano até começar a ser testado por utilizadores. Desde então, tem vindo a ser aperfeiçoado.
Como funciona e a quem serve a Apps?
“Apps são aplicações para empresários. E do que é que um empresário precisa na sua actividade? Esta é a pergunta a que a Apps procura responder: um empresário precisa de um software para emitir facturas, recibos e orçamentos; precisa de um mecanismo de controlo de assiduidade dos funcionários; um sistema de gestão de veículos, para prevenir abusos e poupar combustíveis; precisa de gerir e-mails”, explicou Stélio Inácio à E&M. O jovem informático realça que a criação da Apps surgiu também com a intenção de suprir necessidades pelas quais que ele mesmo já passou, como empreendedor. De uma forma geral, a Apps traz três elementos principais que o podem tornar inovador para muitas organizações.
Inovação no campo da facturação
O software de facturação oferece a tecnologia “mensagem para cotação”, que permite criar orçamentos através de mensagens, usando linguagem natural, substituindo o tempo de preenchimento de longos formulários. O processo fica mais rápido e eficiente. Também faz com que este se torne no primeiro programa de facturação que pode confortavelmente ser usado num telemóvel, pois basta uma mensagem para gerar uma cotação. “Nós acreditamos que as empresas que mais podem beneficiar são aquelas que contam com poucos colaboradores, porque podem emitir orçamentos a partir de um telefone, através do sistema de IA. Deixa de ser necessário ir até ao escritório e perder tempo a produzir esses documentos”, afirma o fundador da Jon Artificial Intelligence.
O sistema é aberto a vários tipos de empresas, inclusive àquelas que têm um processo de facturação regular, pois a Apps consegue adaptar-se à cobrança de mensalidades. Por exemplo, numa escola em que os alunos pagam propinas a cada mês, o sistema automatiza esse processo. Depois de registar o aluno (que neste caso é o cliente), é gerado uma notificação “por pagar”, “pago”, “em atraso”, conforme a circunstância, e com o clique de um botão, a Apps gera a factura ou recibo do mês correspondente, preenchendo tudo automaticamente.
Por agora, as informações são controladas e disponibilizadas apenas pelo administrador do sistema, que pode ser o proprietário ou director da escola, seguindo o exemplo anterior. Para o futuro está prevista a criação de uma API que gera facturas ou notificações directamente para os clientes, por forma a recordá-los dos pagamentos.
Gerir a assiduidade ou veículos, tudo é acessível
Jobsie é o nome de uma ferramenta que utiliza códigos aleatórios e serviços de localização no telefone para monitorizar a presença de trabalhadores de forma precisa e segura. Esta ferramenta utiliza GPS e códigos de acesso aleatórios. Assim, o empresário não precisa de estar presente no escritório ou de usar outros sistemas de controlo de presenças dos seus colaboradores.
Outra característica inovadora da Apps é o logbook de veículos, que utiliza tecnologia de reconhecimento de texto e imagens para identificar, automaticamente, a quilometragem de veículos por meio de fotos tiradas por telemóvel. Esta ferramenta consegue ainda calcular o ponto de partida e o destino, a distância percorrida e, consequentemente, ter uma noção dos custos com combustível e prevenir o uso indevido de veículos.
A Apps alberga um conjunto de aplicações para pequenas e médias empresas e, desde a sua criação, o sistema procura ser uma alternativa a outras plataformas como o Google Workspace, Microsoft 365 ou Zoho. A IA aplicada oferece uma vantagem competitiva. As empresas reconhecem cada vez mais as vantagens da aplicação de informações de IA aos objectivos comerciais e fazem dela uma prioridade para toda a empresa. Um inquérito feito em 2021 pela McKinsey, uma empresa de consultoria empresarial norte-americana, concluiu que as organizações que comunicaram a adopção de IA em pelo menos uma função, registaram taxas de crescimento da sua actividade.
Pastor, um modelo de linguagem
A IA, no seu sentido mais básico, é uma ferramenta baseada em sistemas que são treinados com base em informações e imagens disponíveis ao público. Os modelos de linguagem natural consolidam-se como um conjunto de soluções, algoritmos e técnicas. Estes modelos são concebidos para compreender a estrutura, a gramática e o significado da linguagem, bem como para gerar texto coerente e contextualmente relevante.
Stélio revelou que quando a OpenAI lançou o ChatGPT, já se encontrava a desenvolver o Pastor, e isto serviu também para dar um impulso ainda maior ao seu projecto. A Apps é mais uma prova de como os modelos linguísticos de IA são componentes essenciais numa vasta gama de aplicações que envolvem o processamento de texto e a comunicação com seres humanos. Desempenham um papel crucial na automatização de tarefas, tornando as interacções com as máquinas mais intuitivas e eficazes. Está disponível através do endereço https://apps.jon-ai.com. Neste momento, Stélio Inácio está a desenvolver um serviço de e-mail que utilizará IA para pesquisa e gestão e que será também parte integrante da Apps.
Texto Ana Mangana • Fotografia D.R.