O Observatório do Meio Rural (OMR), organização não-governamental moçambicana, concluiu que o relatório divulgado pela TotalEnergies sobre a situação humanitária em Cabo Delgado foi omisso e focou-se, de forma “muito superficial e indirecta”, no papel do projecto de Gás Natural Liquefeito (GNL) no agravamento das tensões a longo prazo.
No estudo, intitulado “Soluções Paliativas da TotalEnergies para problemas de extractivismo – Reflexões sobre o relatório de Jean-Christophe Rufin”, divulgado esta segunda-feira (29), e a que o DE teve acesso, a ONG indica que apesar de o documento reconhecer tensões relacionadas com a exploração de recursos naturais, como as pedras preciosas, entre outros factores sociopolíticos, há, no entanto, a omissão de informação sobre o papel deste grande projecto de gás quanto ao aumento da instabilidade no Norte do País.
“O projecto de exploração de gás desencadeou uma grande pressão sobre a terra, deslocações de populações, aumento da migração para a região, inflação generalizada e sentimentos de ameaça e exclusão por parte dos nativos no acesso a empregos e recursos energéticos”, aponta a análise sublinhando haver naquela província uma economia política “de carácter extractivista, com pouca relação com o tecido económico local, pouco geradora de emprego, promotora de desigualdades e exclusão social, num cenário de reduzida transparência governamental”.
De acordo com a ONG, apesar de a maioria da população ser constituída por camponeses ou pescadores, as políticas públicas de desenvolvimento secundarizam a produção familiar, contribuindo para a baixa produção e produtividade agrícola, para a reprodução da pobreza e na persistência da insegurança alimentar.
Não obstante a preocupação dos técnicos da TotalEnergies na gestão dos incidentes entre as forças de segurança e a população, pode entender-se como uma omissão de episódios amplamente conhecidos e como “um silêncio cúmplice”, visto que há “relatos de violações de direitos humanos ao longo do conflito”.
No geral, o documento afirma não haver nas recomendações feitas pelo relatório da Total qualquer referência ao diálogo e à construção da paz. “Apesar da identificação das causas complexas do conflito assim como de se conhecerem os líderes da insurreição, a realização de reformas com o objectivo de promover o diálogo e a paz continua a ser evitada, e, assim, o conflito arrasta-se no tempo”.