Um novo estudo científico descreve o mecanismo que pode acelerar ou inverter o envelhecimento das células. O trabalho mostra que uma quebra na informação epigenética provoca o envelhecimento de ratos de laboratório e que a restauração da mesma pode conduzir ao seu rejuvenescimento.
Uma nova investigação, publicada na revista científica Cell, desafia a crença científica de que o envelhecimento é o resultado de mutações genéticas no nosso ADN. David Sinclair, investigador principal do estudo, professor de genética e co-director do Paul F. Glenn Center for Biology of Aging Research, em Boston, Massachusetts, nos EUA, há muito que defende que o envelhecimento é o resultado da perda de instruções críticas de que as células precisam para continuarem a funcionar. O investigador denomina este fenómeno como Teoria da Informação do Envelhecimento.
Durante décadas, os geneticistas concentraram-se principalmente nas mutações no ADN para explicar o envelhecimento. Estas mutações podem, com o passar do tempo, corromper o normal funcionamento das células, que levam à decomposição de tecidos e órgãos e se traduzem na morte celular. Contudo, estudos científicos realizados ao longo do tempo descobriram que algumas pessoas e ratos com altas taxas de mutação não mostram sinais de envelhecimento prematuro, e outros observaram que muitos tipos de células envelhecidas têm poucas ou nenhumas mutações.
Para testar a sua teoria nesta nova investigação, David Sinclair e a sua equipa começaram por induzir o envelhecimento normal em ratos de laboratório sem provocar mutações ou cancro, com a principal experiência da equipa a envolver a criação de cortes temporários no ADN dos animais. Estas quebras imitam as quebras nos cromossomas que as células dos mamíferos experienciam todos os dias em resposta a estímulos externos.
A equipa chamou ICE ao seu sistema, acrónimo em inglês para “alterações induzíveis ao epigenoma” (o epigenoma responde aos sinais ambientais e liga ou desliga os genes, aumentando ou reduzindo a sua actividade). “A epigenética é o sistema operacional de uma célula, dizendo-lhe como usar o mesmo material genético de forma diferente”, explica Jae-Hyun Yang, co-autor do estudo. Deste modo, os investigadores conseguiram envelhecer tecidos no cérebro, olhos, músculos, pele e rins de ratos. “Iniciámos a experiência num rato quando eu tinha 39 anos. Agora tenho 53 e ainda estudamos o mesmo rato”, conta Sinclair.
Ao analisar o funcionamento do corpo humano, o ADN pode ser visto como o hardware e o epigenoma como o software. Os epigenes são substâncias químicas que dizem ao gene “o que fazer, onde fazer e quando fazer”, quando “ligar e desligar” os genes. “Estamos a mostrar por que razão se danifica esse software e como podemos reiniciar o sistema fazendo reset, de forma a restaurar a capacidade que a célula tem de ler o genoma correctamente”, esclarece o investigador.
Segundo o estudo, é como se os nossos corpos tivessem um backup da nossa juventude, podendo ser accionado. O mais surpreendente é que não parece interessar se o indivíduo é saudável ou que idade tem: uma vez desencadeado o processo de backup, “o corpo irá lembrar-se de como se regenerar e voltará a ser jovem, mesmo que já seja velho ou padeça de alguma patologia. Agora, que software é esse, ainda não sabemos”, refere.
As aplicações médicas deste processo em humanos ainda estão muito distantes e serão necessárias extensas experiências em múltiplos modelos celulares e animais. Para isso, a equipa já está a testar esta prática em primatas. A ambição dos investigadores passa também por encontrar uma forma de rejuvenescer um rato de uma só vez. Sinclair referiu que a sua equipa já reiniciou as células em ratos em mais do que uma ocasião, mostrando que o envelhecimento pode ser revertido por diversas vezes.
As implicações de poder envelhecer e rejuvenescer tecidos, órgãos, animais ou mesmo pessoas entram no domínio bioético, o que levanta a consideração sobre o que significaria atrasar continuamente o relógio, evitando o envelhecimento. “Esperamos que os resultados transformem a forma como encaramos o processo de envelhecimento e a maneira como abordamos o tratamento de doenças associadas ao envelhecimento”, diz Jae-Hyun Yang.
Este estudo é apenas o primeiro passo na redefinição do que significa envelhecer “Não compreendemos como o rejuvenescimento funciona, mas sabemos que funciona”, afirma David Sinclair. “Podemos usá-lo para rejuvenescer partes do corpo e, esperamos, fazer medicamentos que serão revolucionários. Agora, quando vejo uma pessoa mais velha, não a vejo tão velha. Apenas a vejo como alguém cujo sistema precisa de ser reiniciado. Já não é uma questão de se o rejuvenescimento é possível, mas uma questão de quando”, remata.
Fonte: Sapo
Discussion about this post