O especialista angolano de Relações Internacionais, Osvaldo Mboco, classificou esta terça-feira, 24 de Janeiro, como “diplomacia de jogo de cintura” o reposicionamento do Presidente angolano, João Lourenço, face à invasão russa na Ucrânia, visando a manutenção das relações com as potências mundiais “sem incidente diplomático”.
Para o analista, Angola, que também tem interesses no sistema internacional, é um importante actor no continente africano e o seu reposicionamento face à guerra na Ucrânia traduz-se num imperativo para manter as relações com a China, Rússia e os Estados Unidos da América (EUA).
“Daí que obriga, com algumas aspas, o Presidente João Lourenço a adoptar uma diplomacia de jogo de cintura, que deverá ter o tacto político no sentido de conseguir manter as relações que tem com as três grandes potências sem criar nenhum incidente diplomático”, afirmou, esta segunda-feira, o especialista, em declarações à Lusa.
Osvaldo Mboco, que comentava a visita do ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, a Angola, disse que o posicionamento do país face à negociação das quatro províncias da Ucrânia “demonstrou um outro realinhamento”.
“Não chamaria que beliscou, mas, tendencialmente, demonstrou um outro realinhamento, tendo em linha de atenção o posicionamento de Angola junto do continente africano e aqueles que são os interesses russos instalados em Angola e ainda o alinhamento estratégico tradicional existente entre estes dois Estados”, frisou.
No entender de Osvaldo Mboco, os recentes posicionamentos do Presidente angolano diante do conflito na Ucrânia sinalizaram, por um lado, a aproximação com instituições ocidentais, “particularmente com os EUA”, postura que “lançou um sinal ao sistema internacional da aproximação de Angola com estas instituições (europeias) e com o Estado americano e, de facto, os seus parceiros internacionais tradicionais, nomeadamente a Rússia, entendem que há um afastamento agora”, apontou.
“Este afastamento não se resume simplesmente ao posicionamento na questão da negociação das quatro províncias pela Rússia a nível da Ucrânia, mas manifesta-se em grande medida pelo facto de o Presidente João Lourenço ter demonstrado vontade e intenção de equipar o exército angolano com armamento americano”, notou.
“Logo, há aqui uma cooperação que é muito antiga, que tem um grande volume de negócio que era feito com a Rússia e pode deixar ser feito se, de facto, Angola avançar para a aquisição de armamento americano em detrimento do armamento russo”, assinalou.
O ministro dos Negócios Estrangeiros da Federação Russa, Serguei Lavrov, chegou esta segunda-feira à capital angolana para se encontrar com o seu homólogo, Téte António, e com o Presidente angolano, João Lourenço.
A visita de trabalho do responsável dos Negócios Estrangeiros, com os encontros oficiais previstos para amanhã, 25 de Janeiro, acontece numa altura em que Angola, após posicionar-se de forma neutra perante a guerra na Ucrânia, abstendo-se de votar uma resolução das Nações Unidas condenando a invasão russa em Março, juntou-se em Outubro à maioria dos países que condenaram a anexação de territórios ucranianos pela Rússia.
Angola tem vindo a reposicionar-se nos últimos meses em termos de política externa, aproximando-se dos Estados Unidos da América e da União Europeia e distanciando-se da Rússia.
Segundo Osvaldo Mboco, a visita do chefe da diplomacia russa a Angola deve servir também para Lavrov “relembrar alguns acordos bilaterais e ver qual será a posição do seu país em Angola”, face ao actual reposicionamento do país lusófono no panorama internacional.
A importância de Angola no continente africano foi igualmente sinalizada por este especialista, referindo que a recente visita do ministro dos Negócios Estrangeiros da China e a conversa telefónica entre João Lourenço e o secretário de Estado norte-americano demonstram o valor do país africano.
Em Abril de 2019, o chefe de Estado angolano visitou Moscovo e discursou perante os 450 deputados da Duma (a Câmara Baixa do Parlamento russo), incentivando a uma maior cooperação empresarial em áreas que contribuíssem para a diversificação da economia angolana.
Angola mantém, há décadas, relações com a Rússia desde os tempos da extinta União Soviética, sobretudo nos domínios militar, educação e saúde.
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