O ministro português dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, em declarações no final de uma reunião informal de chefes de diplomacia dos 27, que teve entre os pontos em agenda um debate sobre as relações entre UE e África e o combate à desinformação promovido pela Rússia no continente africano, revelou haver preocupação, pois, em diversas partes do continente, é possível ver “um grande investimento [russo] na desinformação, na propagação de mensagens falsas e na criação de dinâmicas negativas em relação à Europa”.
Apontando a título de exemplo “a forma como, no Mali, a Rússia procura desenvolver narrativas anti-francesas”, uma política que pratica “noutras partes do continente africano, aproveitando circunstâncias locais”, o ministro sublinhou a dificuldade da luta contra a desinformação, pois de um lado há regras, e do outro não.
“Em matéria de desinformação, é um combate desigual, porque nós combatemos de acordo com as regras. Procuramos mostrar a verdade e isso é algo que é limitado, enquanto a Rússia não se coíbe de inventar todo o tipo de narrativas que podem ter alguma tracção a nível local, e que são muito difíceis de combater, excepto caso a caso, individualmente”, declarou.
No entanto, ressalvou, “não há nada como ir dialogando, ir falando, mantendo uma intensidade de contacto com colegas africanos para ajudar a encontrar soluções”.
Por outro lado, defendeu que “é também importante sublinhar que África não é um continente homogéneo”, pelo que esse diálogo que defende não pode ser cego.
“Nós, portugueses, convivemos muito com África, e sabemos de grandes diferenças de uma parte do continente para outra parte do continente, e temos de ser sensíveis em relação a essas realidades diferentes, e dialogar de modo a que seja compatível com essas realidades, e não de forma ‘cega’, àquilo que são as múltiplas diferenças de um lado do continente para o outro”, argumentou.
Em termos mais gerais, designadamente às relações entre Europa e África, o chefe da diplomacia portuguesa considerou que “o debate sobre África foi muito oportuno. Aquilo que sobressai do debate é uma consciência de que nós precisamos de nos manter fiéis aos compromissos assumidos durante a cimeira Europa-África, que aconteceu em Fevereiro, imediatamente antes da invasão da Ucrânia”, disse, observando que, devido à guerra lançada pela Rússia, “as atenções, as energias da UE têm estado mais viradas para o Leste europeu”.
“É natural que haja, portanto, essa necessidade de nos concentrarmos agora em assumir os compromissos”, salientou.
O ministro disse que os Estados-membros da UE estão “muito conscientes de que África está numa mudança profunda e rápida, por dois factores estruturantes e que vão alterar a realidade africana no prazo das próximas décadas”: as alterações climáticas e a mudança geracional no continente africano.
“As alterações climáticas têm um impacto tremendo em todo o mundo, mas o continente africano é dos mais afectados, e isso vai provocar grandes desequilíbrios em diversas partes do continente”, apontou.
Em segundo lugar, prosseguiu, “África tem uma população extremamente jovem, há uma mudança geracional cuja realidade se vem a fazer sentir um pouco por todo o continente africano, e essa mudança de geração pode ser uma oportunidade interessante para a UE”.
“Veja-se quais são os valores e as aspirações dos jovens africanos, e compreendemos que há muita compatibilidade com aquilo que são valores e aspirações europeias. E nós temos de saber corresponder a essa potencialidade investindo na juventude africana”, afirmou.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, que antes de participar na reunião de Praga esteve em Angola, para acompanhar o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, nas cerimónias fúnebres do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos, segue da República Checa para Moçambique, para acompanhar a visita do Primeiro-ministro, António Costa, esta quinta-feira e sexta-feira.