Ao aterrarmos em Malanje, Angola, descobrimos uma cidade onde o passado e presente se cruzam. Primeiro, destacam-se edifícios da ocupação colonial bem preservados e que se sucedem ao longo da Avenida Comandante Dangereux, que atravessa a cidade, cruzando-se com o rio Malanje no seu percurso entre a Lagoa da Guiné e o Kwanza, onde desagua.
Bem no centro urbano encontramos as sedes do Banco Nacional, do Governo Provincial, o verdejante Jardim Municipal em frente à moderna estação dos comboios e a imponente Sé Catedral, classificada, em 2017, como património histórico-cultural de Angola.
Nas redondezas descobrimos construções e condomínios modernos que revelam o crescimento recente da cidade, elevada a esta categoria no dia 13 de Fevereiro de 1932, e que está agora empenhada numa reconstrução que a torne cada vez mais apelativa.
E é a partir daqui que saímos à descoberta das várias atracções da província, um território com uma diversidade de paisagens, de fauna e flora capazes de encantar quem o visita.
A primeira paragem da viagem está marcada para a vila de Cacuso, em cujo centro encontramos ainda muitos edifícios típicos da época colonial. Rumamos ao sul, em direcção às famosas Pedras Negras de Pungo Andongo.
Após alguns quilómetros, começamos a vislumbrar no horizonte de uma das intermináveis rectas da estrada, a silhueta das formações rochosas que, ao longo de milénios, os elementos se encarregaram de arredondar e que testemunharam momentos fulcrais da História do país.
Atravessamos a planície, que começa a ser rasgada por gigantescas pedras com formas curiosas onde tentamos “encaixar” animais e objectos para, em poucos quilómetros, desviarmos à esquerda, onde somos recebidos por uma placa de boas-vindas na estrada que dá acesso aos pontos mais espectaculares da região.
Percorremos a pé um corredor de pedra a partir do qual temos uma vista única sobre o vale onde o rio Kwanza se espalha, bloqueado poucos quilómetros à frente pela Barragem de Capanda cuja albufeira também podemos visitar na fronteira com a província do Kwanza Sul.
Protegidas por estruturas simples de cimento, encontramos as míticas pegadas impressas nas rochas que o povo garante serem dos reis Ngola Kiluanji e da sua filha, Njinga a Mbande, que reinaram nas terras do reino Ndongo — aliás, o nome original do lugar é precisamente Pungo-a-Ndongo.
Dedicámos o segundo dia ao património natural, que inclui várias reservas naturais, como as do Luando e Milando, onde se procura preservar a rica fauna da região. Na impossibilidade de visitarmos todas, optamos pelo Parque Nacional de Kangandala, que, em 2005, ganhou enorme importância quando por ali foram avistados exemplares de palancas negras gigantes, subespécie rara de antílope, endémica de Angola, exclusiva da província de Malanje e que se julgava extinta.
Embora seja ainda considerada como em perigo crítico de extinção, a palanca negra gigante encontra neste espaço um santuário que poderá representar a sua sobrevivência.
É na expectativa de podermos observar um destes magníficos animais que chegamos ao mais pequeno de todos os Parques Nacionais de Angola, estabelecido em 1970.
Não temos a sorte de ser premiados pela esquiva estrela do parque, mas descobrimos outros exemplares da fauna local. Aproveitamos a proximidade para um salto à zona dos impressionantes rápidos do rio Kwanza, que ali ganha fôlego na sua rota em direcção ao Oceano.
A atracção que nos levou a Malanje fica reservada para o fim. De manhã cedo, dirigimo-nos para norte, em direcção às famosas quedas de água da Kalandula. Eleitas uma das Sete Maravilhas Naturais de Angola, têm no currículo o título de serem as segundas maiores de África, com as águas do rio Lucala a espalharem-se ao longo de mais de 400 metros de comprimento para se despenharem de uma altura de mais de 100 metros, num espectáculo único.
Assim que paramos o carro no estacionamento próximo do miradouro, somos abordados por jovens guias que se oferecem para nos mostrar os melhores ângulos das cascatas, enquanto no antigo parque de merendas algumas mulheres vendem ginguba e outros petiscos para ajudar a enganar a fome.
À medida que nos aproximamos do miradouro ouvimos o trovão crescente da queda das águas e vislumbramos a névoa que resulta dos pingos que se soltam do imenso caudal. Em dias de vento, alguns são projectados para cima, dando aos visitantes a sensação de uma “chuva que sobe”.
No cacimbo, quando o caudal é menor, podemos aventurar-nos a caminhar sobre as rochas do leito a que as correntes deram formas intrigantes, arredondadas e suaves. Olhando para o vale à frente, deixamo-nos encantar com a imagem do Lucala seguindo tranquilo o seu caminho, depois das dramáticas quedas, num curso que o levará até ao Kwanza. Estas cataratas atraem muitos visitantes seduzidos ao primeiro contacto.
Texto de Susana Gonçalves
Fotografia D.R.