O mundo enfrenta uma escassez desesperada de café arábica, a variedade que dá o sabor mais suave e constitui cerca de 60% da produção mundial. Os abastecimentos foram dizimados após as colheitas destruídas por condições meteorológicas extremas, e com um padrão La Nina previsto até ao início de 2022 que deverá prejudicar ainda mais os rendimentos, poderá levar anos até que o mercado recupere.
Os preços dos arábicas estão a subir para reflectir a crise crescente, enquanto que o congestionamento global dos transportes marítimos está a tornar ainda mais difícil conseguir feijões onde eles são necessários.
Os preços quase duplicaram no ano passado, elevando as perspectivas de custo para empresas como a Starbucks Corp. e Peet’s Coffee & Tea Inc., que favorecem a variedade de grãos de alta qualidade.
Como se pode ver no gráfico abaixo, seria preciso regressar a outubro de 2014 para ver o café a negociar a preços tão elevados. Nesse ano de 2014, o Brasil, responsável por cerca de 40% da produção mundial de café, teve o verão mais quente de que há registo em algumas partes do país, com a seca a ser considerada a pior dos últimos 50 anos. Uma estimativa apontava para que 30% da colheita de café poderia ser perdida.
“Esta não é apenas uma questão de curto prazo”, diz Kona Haque à Bloomber, que lidera a investigação no comerciante de mercadorias ED&F Man em Londres. “Na verdade, é algo que vamos ter em conta nos próximos dois anos”.
Os torrefactores e retalhistas de café têm agora de decidir se devem aumentar os seus próprios preços. Mas eles também têm outra opção: o primo mais duro do Arabica, o Robusta. Alguns já estão a utilizar mais desta variedade mais barata, que é tipicamente bebida em cafés instantâneos e contém mais cafeína que lhe dá um sabor amargo.
Alguns cafés e marcas concentram-se exclusivamente numa ou outra variedade, mas muitos utilizam uma mistura de ambas para criar um sabor específico. O arábica é mais doce e tipicamente utilizado em bebidas como cappuccinos e lattes, o robusta tem sido tradicionalmente popular em Itália para café expresso ou liofilizado para uso em café instantâneo.
Desta vez, não só são as condições meteorológicas a afectar o preço, mas também uma série de outras condicionantes. O Brasil enfrenta uma seca contínua e está no rescaldo de um inverno frio e das geadas que destruíram algumas colheitas. Entretanto, a precipitação excessiva tem tido impacto nas colheitas na Colômbia, o segundo maior exportador do mundo. Os dois países são responsáveis por quase três quartos da produção mundial de café arábica.
Os problemas contínuos das cadeias de abastecimento complicaram também o processo de expedição e conduziram a custos mais elevados. Por outro lado, temos ainda a manutenção duma procura forte associada a uma queda dos stocks de grãos arábica. O elevado custo dos fertilizantes e a contínua escassez de mão-de-obra são outros fatores.
O café foi mais uma das mercadorias que se veio juntar à já extensa lista de bens e serviços que utilizamos no dia-a-dia, como a carne, a fruta, o pão, o gás ou a gasolina, e cujo preço tem subido nos últimos meses, à medida que a economia global recupera da pandemia da COVID-19. O índice de preços no consumidor nos EUA aumentou 6,2% em outubro, o maior aumento em mais de 30 anos.
O rally desta semana veio na sequência de uma queda nos stocks e da apreciação do real brasileiro, que tornou menos vantajosa a venda do café cotado em dólares. Além disso, as primeiras projeções para a colheita de 2022 do país indicam que deverão ser em linha com as colheitas de 2020-21, o que limita a reconstituição das reservas necessárias para resistir ao típico mergulho na produção da colheita seguinte.
“Os mercados mundiais de café permanecem deficitários e sempre que os preços caem, vemos a indústria a comprar antes que subam ainda mais”, referiu Kona Haque, que lidera o departamento de research da empresa de trading de commodities ED&F Man em Londres.
É provável que os preços se mantenham elevados à medida que os altos custos de transporte se traduzem em lucros para produtores, exportadores, importadores, torrefatores e retalhistas. Em sentido contrário, vão as ações de empresas cujo principal negócio é vender café aos seus clientes, que vêem as suas margens a serem reduzidas substancialmente.