O horizonte a partir da costa de vilankulo não nos permite distinguir onde termina o mar e começa o céu, como se fossem extensões um do outro. O azul no longo lençol que se estende à nossa frente torna material a imagem “amar sobre o Índico” sugerida pelo poeta Eduardo White.
Ainda a âncora repousa no fundo do mar, quando o comandante faz o aviso à navegação: “pelo caminho, podemos avistar golfinhos e tartarugas. Avisem, caso vejam, para que paremos”.
Então seguimos viagem de olhos esbugalhados, sempre em alerta, para ver este espectáculo que são os golfinhos em piruetas e as tartarugas com as carapaças no limite do mar. Os pequenos focos de espuma que se levantam com as ondas lembram-nos silhuetas de golfinhos ou de tartarugas ou de dugongos ou de baleias,
que quem frequenta estas paragens diz já ter visto.
Arregalamos os olhos ainda mais, como se a natureza já nos tivesse dado o que queríamos ver e apenas o nosso
olhar falho nos impedisse.
Mas a verdade é que precisaríamos de sorte. Depois de alguns quilómetros feitos de solavancos – a estrada de
água também tem os seus buracos –, uma tartaruga permite-se ver, mas por um momento fugaz, que é mais
fácil fazer a fotografia com os olhos do que tentar com uma câmara fotográfica.
Para a subida às dunas é preciso fôlego, o ar está húmido e o sol começa a esgueirar-se entre as nuvens. É como se escalássemos uma montanha
Se há viagens que valem mais pelo caminho do que pelo destino, esta podia ter sido uma delas, se não fosse
Bazaruto um caminho-destino que a cada movimento nos oferece novas imagens, como se fosse um caleidoscópio.
O Anantara Bazaruto Island Resort é a porta de entrada para a Ilha maior que dá nome ao arquipélago, com
quase 33 km de comprimento e cerca de 5 km de largura, guardião de uma reserva faunística sem muitos
paralelos no mundo.
O facto de Bazaruto albergar a última população de dugongos das costas africanas é apenas um dos cartões-de- -visita. A tarde já se faz alta.
O primeiro dia será apenas de reconhecimento. Com a lua imperativa no céu e a agenda do dia seguinte posta
à mesa, percebemos que entrar para Bazaruto pelo Anantara é abrir o portal para um parque natural de
diversões. Mas a manhã seguinte chega fechada, com nuvens negras a negarem protagonismo ao astro-mor.
O chão ainda húmido testemunha, pela chuva caída pela madrugada, o que na tradição africana significa
benção e que é, para nós, um mau agoiro. Se é verdade que as ilhas se fazem de terra cercada de mar,
não é menos verdade que a presença do sol dá outra cor à terra e ao mar.
As lagoas, que escondem crocodilos, acabam por ser um ponto preferencial das aves
Mas, ainda assim, arriscamos a subida às dunas. Depois de um percurso de 30 minutos em terra batida, a bordo de uma viatura 4×4, chegamos ao início da verdadeira viagem, que seria feita com os pés descalços. É menos uma questão de tradição e mais de mobilidade.
Pegadas vincadas pela humidade do terreno chamam-nos a atenção. “É cabrito vermelho” – diz-nos, assertivo, o
guia. Ao longo do dia, ainda nos cruzaríamos com o “bicho” que se negou a ser domesticado e passeia livre e
protegido pela floresta que agora é reserva.
Para a subida às dunas é preciso fôlego, o ar está húmido e o sol começa a esgueirar-se entre as nuvens. É como se escalássemos uma montanha. Quando chegamos ao cimo, com uma visão privilegiada do horizonte.
Ver, aqui, o nascer e o pôr-do-sol é como se visualizássemos uma partida de pingue-pong em câmara-lenta
entre os deuses do norte e do sul.
Com o dia já completamente aberto, fazemos o passeio cultural pela comunidade. Lourenço Nhassengo, 51 anos a marcarem-lhe o rosto e toda uma vida vivida na Ilha, é o cicerone. É ele que nos conta sobre as duas teorias da origem do nome da Ilha.
Bazaruto já foi uswulutho, como os nativos a chamavam pela neblina escura que a caracterizava. Mas a pronúncia portuguesa tornou uswulutho em Bazaruto.
Para outra teoria, o nome tem origem nas bazarutanas, conchas abundantes na Ilha. Teorias à parte, Bazaruto é uma experiência prática. Nas margens da lagoa Mahungwé, erguem-se caniçais com ninhos de pássaros tecelão.
As lagoas, que escondem crocodilos, acabam por ser um ponto preferencial das aves.