A Amnistia Internacional (AI) denunciou nesta quarta-feira, 7, que três anos após o início dos combates na província de Cabo Delgado, as vítimas do conflito que matou mais de duas mil pessoas continuam a lutar por justiça, verdade e reparação.
Em contrapartida, “autoridades não conseguiram responsabilizar criminalmente todos os suspeitos de terem cometido crimes contra o direito internacional e violações de direitos humanos”.
A nota daquela organização de defesa lembra que, apesar do primeiro ataque ter acontecido a 4 de Outubro de 2017, “os ataques violentos deste grupo aumentaram 300 por cento, nos primeiros quatro meses de 2020, em comparação com o mesmo período do ano passado”.
“A situação desencadeou uma crise humanitária, com mais de dois mil mortos, 300 mil deslocados internos e 712 mil pessoas com necessidade de assistência humanitária”, acrescenta a AI.
Al-Shabab
O grupo denominado localmente al-Shabab, que nos últimos tempos tem sido apontado como tendo ligação com o Estado Islâmico, é, segundo a AI, “responsável por um sofrimento indescritível em Cabo Delgado”.
O director para a África Oriental e África Austral da AI, Deprose Muchena, diz que eles “reduziram casas a cinzas através de ataques coordenados de fogo posto, mataram e decapitaram civis, saquearam alimentos e propriedades, e forçaram centenas de milhares a fugir das suas casas”.
As Forças de Defesa e Segurança (FDS) também não estão isentas das acusações da AI, que diz ter provas de que elas “também cometeram crimes contra o direito internacional e violações de direitos humanos, incluindo desaparecimentos forçados, tortura e execuções extrajudiciais”.
Forças de Defesa e Segurança acusadas e censura
Para Muchena, “estes crimes são agravados pelo facto de as autoridades moçambicanas não permitirem que jornalistas e investigadores locais e internacionais documentem esta situação sem que sofram consequências”.
As FDS, diz a AI, são “acusadas de crimes contra o direito internacional e violações de direitos humanos na perseguição dos suspeitos de fazerem parte do grupo armado, como execuções extrajudiciais, tortura e outros maus-tratos”.
A organização lembra igualmente que “o exército também foi implicado em sequestros e detenções arbitrárias de jornalistas, investigadores, líderes comunitários e outras pessoas que tentassem expor os abusos”.
O grupo não fez nenhuma reivindicação política, mas analistas defendem que os motivos dos ataques estão ligados à centralização do poder em Maputo e à exclusão social e económica da população de Cabo Delgado
O director para a África Oriental e África Austral da AI afirma que “as violações contra a população civil devem terminar imediatamente, e que as autoridades moçambicanas devem garantir que nenhum suspeito de crime, incluindo as forças de segurança, fique impune”.
A organização defende “uma investigação independente e imparcial sobre estes graves abusos e, se houver provas admissíveis suficientes, devem ser feitas acusações em julgamentos justos perante tribunais civis comuns”.
A AI ainda lembra que, nas últimas semanas, houve relatos incontestáveis de tortura e outros crimes ao abrigo do direito internacional cometidos pelas FDS em Cabo Delgado.
A organização acrescenta ter analisado imagens da região que mostravam “tentativas de decapitação, tortura e outros maus-tratos de detidos, o desmembramento de alegados combatentes de grupos armados, possíveis execuções extrajudiciais e o transporte de um grande número de cadáveres até valas comuns”.
A AI conclui que “o grupo não fez nenhuma reivindicação política”, mas analistas defendem que os motivos dos ataques estão ligados à centralização do poder em Maputo e à exclusão social e económica da população de Cabo Delgado”.