Milhões de trabalhadores em países asiáticos que fabricam as roupas vendidas por muitas das marcas mais conhecidas do mundo – C&A, Gap, Zara, H&M, Target, Primark, JCPenney, Marks & Spencer e outras – estão em risco de cair no desemprego.
As cadeias de fornecimento internacionais representam um dos aspectos mais evidentes da globalização, e também um dos mais criticados, por abrirem a porta à exploração de populações economicamente vulneráveis. Com o encerramento das lojas e o confinamento da população, as marcas deixaram de ter forma de escoar as roupas, e, portanto, não as estão a importar.
No Bangladesh, o maior fornecedor desse tipo de produtos a seguir à China, as encomendas canceladas ou suspensas já ultrapassam os 3,4 mil milhões de euros, deixando 2,2 milhões de trabalhadores em situação precária.
Em condições normais, esses trabalhadores – mulheres, na maioria dos casos – já trabalham muitas horas, a troco de um salário que em média não ultrapassa os 110 dólares. Com a actual situação, o rendimento desapareceu e em muitas famílias o outro membro do casal também perdeu o emprego.
Oitenta por cento das exportações do Bangladesh referem-se à indústria do vestuário, o que mostra a dimensão do problema. Grande parte das marcas cancelaram os contratos invocando a cláusula de força maior.
Um “verão devastador” que se anuncia
Falando à BBC, um proprietário de fábricas com milhares de empregados diz que não quer ajuda, apenas que as marcas cumpram os contratos já existentes.
Nota que essas empresas têm vastas reservas de capital e que os seus principais accionistas são milionários, que, na sua opinião, “têm meios” para fazer que os trabalhadores sejam pagos.
Na internet já estão a circular petições que instam as marcas a pagar as suas encomendas para salvar vidas. Algumas comprometeram-se a fazê-lo, outras nem tanto, limitando-se a fazer acordos com os seus vendedores mais importantes, deixando muitos outros de fora.
Num texto publicado no “Washington Post”, o presidente da Associação de Fabricantes e Exportadores de Vestuário no Bangladesh, Rubana Huq, diz que essa estratégia “é pouco ética” e que as marcas, ao comportarem-se assim, “vão comprometer as suas cadeias de fornecimento a longo prazo”.
Apela ainda que organizações e académicos as pressionem a cumprir as suas obrigações. De outra forma, conclui, “o cruel mês de Abril arrisca tornar-se um verão devastador”.