Mais de cem organizações não-governamentais (ONG) lançaram hoje um apelo para que os pagamentos da dívida dos países pobres, cujas finanças estão assoberbadas pelo combate à Covid-19, sejam cancelados, incluindo aos credores privados.
“As organizações pedem o cancelamento imediato dos pagamentos da dívida aos países em desenvolvimento em resposta à crise económica e de saúde”, disse o economista-chefe da ONG britânica Comité para o Jubileu da Dívida, Tim Jones.
O documento, enviado ao Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial e governos do G20, defende várias medidas para cancelar o pagamento da dívida dos países em desenvolvimento e defende “a criação de um processo para trazer o peso da dívida para níveis sustentáveis através do cancelamento geral da dívida nos próximos anos”, acrescentou o director do departamento de políticas públicas da ONG britânica.
As organizações pedem o cancelamento imediato dos pagamentos da dívida aos países em desenvolvimento em resposta à crise económica e de saúde
Entre os subscritores do documentos está a ONG portuguesa Oikos, a moçambicana Mozambican Debt Group e várias ONG brasileiras, que defendem no texto que “os governos devedores têm o poder de parar de fazer pagamentos da dívida e não devem sofrer quaisquer penalizações se o fizerem” e argumentam que “os credores devem, por isso, concordar com o cancelamento imediato dos pagamentos da dívida este ano, não acumulando juros nem penalizações” pelo incumprimento.
A solução defendida no documento assinado por mais de 100 ONG é o cancelamento imediato dos pagamentos da dívida seguida de um processo de cancelamento e reestruturação das dívidas
O FMI e o Banco Mundial já defenderam um perdão de dívida relativamente aos pagamentos da dívida pública, mas ainda não é claro se defendem que os países não paguem os empréstimos de outros países ou se esse ‘perdão’ deve ser estendido aos pagamentos dos juros das emissões de dívida soberana, que tem sido o modelo mais usado pelos governos, nomeadamente os africanos, nos últimos anos.
Os ministros africanos, ainda em Março, pediram um perdão dos juros da dívida que seriam pagos este ano, mas numa segunda reunião com a directora executiva da Comissão Económica das Nações Unidas para África, Vera Swonge, alargaram o pedido para um perdão de dívida total devido aos constrangimentos que o combate à pandemia da Covid-19 acarreta para estes países, que enfrentam igualmente um forte desequilíbrio orçamental originado pela descida das matérias-primas e pelo consequente aumento do endividamento.
Para a directora do Comité para o Jubileu da Dívida, os países em desenvolvimento enfrentam um duplo desafio: “Estão a ser atingidos por um choque económico sem precedentes, e ao mesmo tempo enfrentam uma emergência médica urgente, a suspensão dos pagamentos da dívida defendida pelo FMI e pelo Banco Mundial poupa dinheiro agora, mas atira o problema mais para a frente e evita, na verdade, que se resolva o problema dos pagamentos em espiral”, argumentou Sarah-Jayne Clifton.
A solução defendida no documento assinado por mais de 100 ONG é o cancelamento imediato dos pagamentos da dívida seguida de um processo de cancelamento e reestruturação das dívidas.
“Os pagamentos devem ser imediatamente cancelados, incluindo os pagamentos aos credores privados, porque esta é a maneira mais rápida de manter o dinheiro nos países, que o usarão para responder à pandemia, e garantir que o dinheiro não serve para ‘salvar’ os lucros dos especuladores privados ricos”, defendeu a directora da ONG.
Agência Lusa